quinta-feira, maio 13, 2004

Infância – Os reencontros costumam ser de natureza e de resultado inesperados. De natureza porque são imprevisíveis, surgem quando menos os esperamos, quando as nossas defesas têm a guarda em baixo e estão mais vulneráveis. De resultado porque, normalmente, ou nos deixam muito contentes ou muito irritados. Encontrar aquela pessoa que não víamos há muito tempo mas que, por acaso, acontece que não suportamos, não nos faz o dia, ao invés, contribui drasticamente para que soltemos um daqueles por que raio saí da cama hoje!

Hoje, resolvi falar de um reencontro que me fez sorrir. Um reencontro muito especial e importante. Platónico, contemplativo, embora tão intrinsecamente físico. Sabe-se lá há quanto tempo não lhe tomava nos meus braços, passava pelas minhas costas e a percorria com os dedos. Duma ponta à outra. Por vezes com delicadeza, com a subtileza que o momento exige; outras, repentino, brusco, respondendo ao pedido rítmico, agressivo, impetuoso.

Naquela hora em que deslizei pelas cordas da minha guitarra que, por culpa duma falta de desejo crónica, esteve a ganhar raízes no suporte durante meses a mais, voltei a sentir aquela fúria. Aquela que também esteve presente no dia em que disse para mim mesmo pela primeira vez que queria segurar num daqueles “bacalhaus” e perceber como funcionavam. Voltei a ser aquele miúdo com um mistério pela frente.

No máximo, e talvez seja este um máximo já de si bastante maximizado, houve cinco minutos em que eu e ela soámos verdadeiramente a música. No meio de inúmeros acordes, sons, notas, poucas são as frases, os pequenos e tão incrivelmente efémeros discursos, que conseguem dizer aquilo que queremos efectivamente dizer.

Por isso valem pelos restantes cinquenta e cinco.