sexta-feira, setembro 30, 2005

Passei pelo porteiro – que por uma vez não estava a dormir e me abriu logo a porta. Puxei o elevador, abri a porta de casa. Tirei os ténis sem desapertar os atacadores, mandei-os para um canto. Estiquei os pés, dei-lhes a oportunidade de aproveitar um descanso de algumas horas, algo que não tem sido comum. Mas só durante umas horas. Esta será a noite da despedida e terá os contornos necessários para que possa dar um adeus condizente aos paulistanos.

São, neste momento, qualquer coisa como 17 horas em São Paulo. A temperatura baixou para os 22 graus, mais coisa menos coisa; hoje chegou aos 30, o mais elevado que apanhei durante a estada toda. Amanhã por esta hora estarei a embarcar em Guarulhos e a regressar a casa. Na bagagem não levo muito de material; Sampa não é um destino turístico, não há lojas de souvenirs nem nada que possa ser considerado realmente típico. Levo antes muitas páginas do meu caderno rabiscadas com ideias, pormenores, impressões e fotografias.

Para os dias vindouros. Para muito breve. Até Lisboa.

terça-feira, setembro 27, 2005

Era suposto – estar aqui a dissertar sobre o Brasil. Urbano, muito urbano. E rural, muito profundo. Mas não me sinto para aí virado. Vou falar doutra coisa. Igualmente importante e interessante.

Recebemos o cestinho da conta num restaurante. Lá dentro, um rebuçado, toffee. Apercebi-me que não consigo comer um rebuçado sem o trincar.

quinta-feira, setembro 22, 2005

Que o dono – desta chafarica está de férias, não há margem para dúvidas. Quer dizer, tecnicamente ainda não, mas a cabeça já por lá anda. Agora em relação a chafarica em si é que ninguém sabe, segredo dos deuses. Pode ser que no intervalo das passeatas surja aqui um post de pescada ou outro.

quarta-feira, setembro 21, 2005

A realidade – é como chicote. Se acelerada o suficiente, ela estala.

terça-feira, setembro 20, 2005

Há mais de quinze dias – que, por motivos de formatação discal, não tenho computador nem, por conseguinte, Internet em casa.

E continuo feliz.
«Inmate numbers in America rose by 25% between 1996 and 2004. America now has 726 prison inmates for every 100 000 people, compared with 142 in England, 91 in France and 58 in Japan. With public prisons notoriously overstretched, private prisons have been quietly picking up the slack since the Reagan years.»

The Economist

segunda-feira, setembro 19, 2005

Há muito - que perdi a conta das vezes em que passei em revista os momentos, as situações, os sítios. Há muito que não te procuro na minha memória. Há muito que te tento esquecer. Há muito que quis desistir. Mas encontras sempre forma de estar presente na tua ausência.

Leio o teu nome e, de repente, estás perante mim. A tua cara. Os teus olhos. O teu cabelo. Sorris e eu tenho a impressão que vens na minha direcção e que me vais abraçar como o fizeste na última vez que te vi. Agarraste-me nos teus braços. Com muita força. Empurraste-me de encontro a ti.

Sabíamos que demoraria até estarmos de novo frente-a-frente. Se é que alguma vez estaríamos. Era na altura e continua a ser agora incerto. Talvez até improvável. Talvez até impossível.

Não sei quanto tempo passou; foi um longo abraço que pareceu curto. Também já não sei se ouvi os teus olhos lacrimejar. Os teus lábios balbuciar. Nem se me ouvi soltar algum som, dizer alguma coisa que quisesse ser reconfortante.

Lentamente, soltaste-me. Olhámo-nos uma vez mais. Ter-me-ás dito adeus, até breve ou até sempre? Ter-te-ei respondido ou sequer ensaiado uma resposta? As mãos estendidas separam-se quando a distância deixou de permitir que continuassem dadas. Seguiste para um lado, eu para outro.

É certo que o tempo apaga os detalhes das fotografias. Come as cores e deforma o papel. Sei que tenho medo de te ver outra vez. Porque posso encontrar a mesma cara. Os mesmos olhos. O mesmo cabelo. O mesmo sorriso rasgado. O mesmo abraço.

Mas não suportarei uma mesma separação.

sexta-feira, setembro 16, 2005

Eu - que te quis pôr de parte, fazer-te desaparecer. Arranjas sempre forma de aparecer. Agora leio-te no meu livro. Estás em todas as páginas, em todos os parágrafos, em todas as linhas.

És personagem principal.

quinta-feira, setembro 15, 2005

A Nicole - tem um apelido paradoxal.

Kid vs Man.

terça-feira, setembro 13, 2005

Segunda-feira - , um dia mau, antipático. As segundas-feiras são segmentos de tempo de vida com, e não importa que me tentem provar errado, uma duração muito superior a 24 horas, ao contrário do sábado, que tem para aí umas duas horas. Porque não apetece começar a semana. Porque parecem não acabar. Porque às segundas toda a gente se lembra de pedir coisas e de arranjar outras tantas para fazer.

Ontem fui particularmente atingido por uma segunda-feirite. Aguda. Saí a horas impróprias para consumo. Com a cabeça feita em água e com a perspectiva de vir ligeiramente mais cedo no dia seguinte para ainda acertar umas agulhas. O meu bólide, companhia insubstituível nestes dias que se antecipam mais compridos que os demais, fez um ligeiro desvio pelas ruas de Lisboa para deixar o Alexandre no Corte Inglês.

Depois fiquei sozinho. E resolvi subir o volume do rádio que acompanha os momentos solitários de mãos ao volante. TSF, uma rádio que, confesso, evito: para cinco minutos de notícias ou música, é preciso gramar com meia hora de publicidade. No entanto, a Marginal tinha começado a passar as músicas mais duvidosas que constam da sua playlist e os meus dedos resolveram resolver (é, admito, ando numa de figuras de estilo) o assunto.

São 21h20, 21h30 de uma segunda-feira. Tenho a TSF sintonizada no rádio do meu carro. Não me tinha apercebido da preciosidade da ocasião. Porquê? Resposta sob a forma de duas palavras: Bancada Central. O mítico programa que faz o rescaldo da jornada. Versão melhorada com o facto de haver um derby aceso para comentar. Não sou capaz de reproduzir o que os participantes disseram. Mas tinham graça.

E depois ri. Muito. À gargalhada. Com cuidado para não descurar na atenção e manter os olhos bem assentes na estrada. De tal forma que o início da noite da gigante segunda-feira começou a encolher, a minguar a olhos vistos. O tempo do trajecto da Marquês da Fronteira até casa passou de vinte minutos a dois.

Obrigado senhor Fernando Correia (é assim, não é…?) e respectivo auditório por encolherem a minha segunda-feira.

segunda-feira, setembro 12, 2005

Miles was a medium, a transformer, a touchstone, a magnetic field; the authentic minimalist (where, although there were so few notes, there was so much in those few notes). No matter how much “noise” there was around him, Miles always came from silence, the notes existing in a purity all their own (the opposite of a vacuum, which is most of minimalism). Miles proved the impotency of the “technicians”, the potency of pure desire.

We are now left with a large hole in which every improviser should (must) question his/her purity of desire, for without a touchstone there is no reflective surface. This is why touchstones are so important, and also shows that in every age we need touchstones to keep the path illuminated enough that we don’t forget it is there (because we are so enamoured of “our” ability). Miles never forgot the music; we will never forget Miles

Keith Jarrett
Gary Peacock
Jack DeJohnette

sexta-feira, setembro 09, 2005

A advertência por obscenidade audível – é atribuída pelo árbitro de cadeira quando a língua do jogador se solta demasiado. Pelo menos, supostamente. Porque se um nativo de um país onde se fale inglês como língua materna der azo à sua liberdade vocal, será facilmente identificado e punido. Assim como alguém que fale castelhano.

Mas se for o finlandês que perdeu ontem com o Hewitt dos “come on” ou o tailandês desengonçado a largar uma tremenda ofensa, a descarregar o cardápio das palavras deselegantes, picantes, qual vai ser o árbitro que vai entender que está na hora de aplicar a sanção…?

Um caso chocante de etnocentrismo.

quinta-feira, setembro 08, 2005

A primeira reacção - não pode deixar de ser maldizer e blasfemar até mais não, dizer coisas como estes gajos passam a vida a gozar com as pessoas, não conseguem por os comboios a andar sem avarias e por aí fora. A linha verde encontra-se com perturbações, como consequência o tempo de espera e de paragem entre estações é mais prolongado do que o habitual. Não me digas, querida.

Saí do Cais do Sodré. Liguei à Claúdia que, aparentemente, já me tinha tentado apanhar, mas eu estava sem rede no apeadeiro. Estava em cima, na entrada principal, ao pé do quiosque de cores duvidosas. Mais ou menos o ponto onde acabava, passo o paradoxo, a interminável fila de pessoas que esperavam um táxi. Esquece, vamos andando, pode ser que apanhemos um pelo caminho.

Logo hoje que tenho uma reunião, diz-me ela. Logo hoje que vim de fato, digo eu. E trouxe, passo a anáfora ou aliteração ou, mesmo, piadola parva, depende de quem analisa, a trouxa; o meu saco de desporto. E coloquei a hipótese de ter um dia comprido e levar carro. Hipótese que descartei ontem à noite.

Passadeira, atravessar a 24 de Julho, seguir a maralha por uma das ruas que menos gosto de percorrer. Os bacalhaus infectos já estavam expostos àquela hora tão matutina. Praça do Município, desde o dia de ontem liberta do Santana. Alguns pombos. Deviam ser corvos, esta cidade é a de Lisboa. Atravessar a praça. Lá vai um táxi com o verde acesso. Não nos viu. Lá vai outro. Desta vez não escapou. Mas quase que tive de me estender ao comprido na estrada.

Depois de lhe dizer o destino, começa logo por nos dizer que a polícia não deixa os táxis irem até lá abaixo ao Cais porque o espaço é reduzido. Há trezentas pessoas à espera na paragem, mas eles não podem passar. Mas pronto, chegam mais tarde mas chegam. Podem chegar chateadas. Mas para quê…? A vida são dois dias e o Carnaval três. Eu cá não me chateio com nada. Posso ficar chateado nos primeiros dez minutos. Mas depois reflicto, ‘tá a ver? Chatear-me…? Para quê.

As mãos largam momentaneamente a pele do volante enquanto batem uma na outra, fazendo um gesto que significa estou-me marimbando. E é mais ou menos aqui que ele dá início à conversa pela qual eu ansiava. Pela qual também ele próprio devia ansiar começar. Um debate quase parlamentar sobre o estado da Nação. Isto tudo entre gesticular e esbracejar acentuados, amarelos queimados, embraiagem patinada na rua da Madalena por preguiça de reduzir para primeira na subida e peões pendurados porque não puderam passar nas passadeiras abalroadas.

Angolano. Nove filhos. Todos formados. Nenhum vive no país. Uma é bióloga no Japão. Para quê…? Somos pobres. E pior. Cada vez mais pobres. Isto até já começa a parecer-se com Angola. Aliás, isto é pior que Angola. Sabe porquê…? Eu digo-lhe porquê! Porque aqui as pessoas sabem ler mas não interpretam. Em Angola, 90% das pessoas são analfabetas, mas com a experiência de vida que têm, conseguem ver e perceber as coisas. Tenho um filho nos Estados Unidos. Austin (seria…?). É… arquitecto paisagístico. Tira seis mil contos. A mulher é professora lá numa escola. E ainda lhes dão casa e comida e vestuário. Tem tudo à borla. Porque razão devia ele estar cá?

A conversa continuou, passou por mais alguns pormenores, deu mais algumas curvas ao sabor da deslocação da viatura, acelerou em mais algumas rectas. Tanto que lhe disse que com tanto (será outra anáfora…?) quadro negro já nem me apetecia ir trabalhar. O senhor vá lá à sua vida que também deve ter que fazer. Ainda é novo. Tem quê, 23, 24…? Posso deixá-los já aqui, do outro lado da rua. Claro que podia.


Já não estou zangado porque o metro hoje de manhã não funcionou. Perdi tempo e meia corrida. Ganhei em sabedoria de taxista. Porque é minha profunda convicção que não há melhor maneira de captar o sentimento popular, auscultar a opinião pública, captar aquela vox populi que tanto nos ensina, do que falar com um fogareiro. Enfim, ou isso ou ir ao barbeiro/cabeleireiro.

Este último binómio para outra altura.

terça-feira, setembro 06, 2005

- Se te disser que é a única coisa que há a fazer, acreditas em mim?
- Não sei… talvez.
- E se te disser que não é, também acreditas?
- É possível.

segunda-feira, setembro 05, 2005

O homem está de pé - encostado ao caixote metálico onde colocam os outdoors. Costuma estar de fato e gravata. Velhos, já foram moda noutros tempos; agora estão em consonância com os seus cinquenta e tais. Hoje veste uma camisa desportiva, umas calças banais. Assim como os sapatos. Os mesmos óculos castanhos. O cabelo grisalho. Barriga.

Fuma. Está sempre a fumar. Abre e fecha os olhos lentamente, pausadamente. Prazenteiramente. Ainda não são oito da manhã e ele suga intensamente a ponta do cigarro. Como se estivesse debaixo de água e o tubo comunicasse com o ar repleto do oxigénio que necessitaria.

Depois tosse. Tosse alto. Uma tosse feia. Uma tosse doente. Uma tosse de quem fuma há muito tempo. Uma tosse de quem fuma todos os dias no apeadeiro enquanto o comboio não vem, antes das oito da manhã. O barulho é desagradável. No Inverno quando o frio também contribui para o debilitar, perde alguns minutos até conseguir repor-se.

As senhoras afastam a cara. Os senhores não param ao pé dele enquanto esperam, preferem ir esperar mais longe. Só está acompanhado quando, por vezes, aquela que presumo ser sua mulher também espera o comboio. E claro, enquanto está de pé naquele apeadeiro descoberto, com bancos metálicos e outdoors coloridos, também fuma para passar o tempo. Enquanto espera.

Levanto os olhos do meu livro. O livro que leio enquanto espero o comboio que há-de vir não tarda porque são quase oito da manhã e o comboio chega sempre antes das oito da manhã, a não ser que haja uma avaria. Levanto os olhos porque os oiço a tossir e a tosse deles mata a minha concentração e eu não consigo passar da mesma linha e nada do que leio está a fazer sentido.

Levanto os olhos e vejo-os tossir, arqueiam o corpo e levam a mão ao peito, franzem a cara com a força com que o peito se comprime. Quase juraria que vejo um esgar de dor naquelas caras quando, de repente, já não é a tosse deles que oiço, é a campainha da estação que toca porque o comboio que chega antes das oito da manhã está finalmente a chegar à estação.

Os cigarros estão agora no chão, esborrachados por pés certeiros. Ainda largam um fio de fumo que sobe, ondulante em direcção à cobertura metálica que protege da chuva. Pego no meu livro aberto, o meu livro que não conseguia ler porque ouvia tossir insistentemente, e dirijo-me à porta do comboio que chegou mesmo a horas, antes das oito da manhã e olho para eles que agora já não fumam porque não se fuma nos transportes públicos e não consigo evitar pensar:

Porque esperam?

domingo, setembro 04, 2005

Disse que ia com ele ao fim do mundo - Até onde fosse preciso. Mas desde que não fosse muito longe e estivesse em casa a horas de jantar.

sexta-feira, setembro 02, 2005

Há quem ache – que só podemos falar do que realmente existe ou aconteceu. Como se a imaginação não fosse mais do que ela própria: imaginação.

quinta-feira, setembro 01, 2005

Baixo, grosseiro, nojento, corrupto, interesseiro, politiqueiro, afronta, ultraje, insultuoso – Tudo palavras que ocorrem quando vejo as operações de charme dos candidatos à Praça do Município a passearem-se pelo Estádio da Luz de águia no braço.