quarta-feira, setembro 22, 2004

- Sois o meu súbdito preferido. Sempre haveis sido. Por isso vos chamei aqui. Sabeis que hoje parto para a guerra. Também sabeis que não gosto de pensar nestes termos, sou por natureza um optimista, mas há que ser realista. Têm havido muitas baixas, o inimigo está bem armado e moralizado, cheio de força. Pode acontecer que nunca mais volte. Como prova do meu reconhecimento em relação aos serviços que me prestaste ao longo de todo este tempo, vou deixar-vos isto.
Tirou uma chave do interior do seu casaco.
- Este é o objecto mais precioso que guardo. É chave que abre o cinto de castidade da minha mulher.

O criado esbugalhou os olhos e abriu a boca para dizer algo.
- Não digais nada, não faleis, deixai-me acabar. Não aceito que não fiqueis com a minha oferta. Se quiserdes encarai-o como uma ordem.
O homem acalmou-se, fechou a boca. Fechou também a mão com a chave lá dentro.
- Só tenho uma condição. Para terdes mesmo a certeza que morri no cumprimento da honra e do dever, só a podereis usar caso eu não volte nos próximos dez anos.
Anuiu com a cabeça. Agradeceu-lhe não só a oferta mas também o voto de confiança que depositava nele. Assegurou-o que não o atraiçoaria.

Os homens reuniram-se à saída do castelo. Houve um discurso e todos soltaram gritos de encorajamento. O amo levantou a espada no ar e deu a ordem de partida. Arrancaram. Ainda não tinham feito cem metros quando o criado apareceu a correr. Conseguiu atrair a atenção da chefia que parou de cavalgar.
- Meu Senhor, perdoai-me, não queria incomodar Vossa Excelência! Estou ciente de que sois uma pessoa ocupada e que não podeis dar conta de todos os pormenores. Não quero com isto acusar-vos de não serdes suficiente capaz…
O amo não esperou para o interromper.
- Dizei o que quereis, homem. Desembuchai! Por que correis assim desalmadamente?

- Meu Senhor, aparentemente havei-vos enganado na chave; esta nem com óleo entra na real fechadura…