terça-feira, outubro 26, 2004

Tinha vinte e poucos anos - quando começou a tocar com o Dizzie, cerca de dez anos depois de ter pegado num clarinete e num sax alto pela primeira vez. Em 1955 foi convidado pelo Miles, um tipo que sempre soube fazer prospecção para se ver rodeado do que de melhor havia nas novas gerações, para tocar no seu quinteto. Foi então que começou a primeira grande fase da sua carreira.

Não durou muito a parceria. O gigante do trompete fartou-se da dependência de estupefacientes e pô-lo a andar. Terá sido esse o ponto de viragem? Boa pergunta. O que é certo é que dizem que o jovem se encheu de coragem, se fechou em casa sozinho, e que venceu o síndrome de abstinência a custo de muito água.

Um novo Coltrane nascia. O Coltrane que se interessou pelas culturas africanas e orientais, o Coltrane que lia Einstein e discutia filosofia, o mesmo que se iniciou em leituras místicas. E que iniciou as suas primeiras sessões em nome próprio, com um tipo de seu nome Thelonious Monk, absolutamente delicioso sentado ao piano.

Miles achou que estava na hora de resgatar o prodígio. Mesmo a tempo para o incluir no “Kind of Blues” de 1959, no mesmo ano em que saiu o portentoso “Giant Steps” (vide 27 de Setembro de 2004).

A partir de 1960 surge sob a influência do modalismo. Provavelmente contagiado pelas sessões do “Kind of Blue”, surgiram obras como “My Favourite Things” e “Impressions”, uma paráfrase do “So What”. Com ele tinha um quarteto de luxo. McCoy Tyner ao piano, Elvin Jones na bateria, Davis e Jimmy Garrison, alternadamente, no contrabaixo.

Tudo acabou em 1965 com a obra-prima absoluta. “A Love Supreme” e a fase mística, religiosa do músico. A estrutura era muito pouco comum para o jazz daquela época. Quatro movimentos: “acknowledgement”, “resolution”, “pursuance” e “psalm”. A criação artística ao serviço da união com o elemento divino.

Daqui até a “Ascension” o caminho não foi longo. Onze músicos foram convidados para as gravações que pretendiam ser de um único trecho, extenso, sem qualquer tipo de estrutura, aleatório, profundamente livre. Eram os primeiros passos do free-jazz, com tipos da laia de Freddie Hubbard e Archie Shepp.

Mais experiências, mais álbuns (“Expressions”, “Interstellar Space”) e as cabeças dos colegas de profissão estavam a andar à roda. Em 1967, Coltrane morre vítima de um tumor do fígado. Em sete anos de carreira empregando o seu nome, demoliu barreiras, construiu novos limites. Marcou indelevelmente, redefiniu toda a linguagem do jazz.

Um dos melhores de todos os tempos.