Chamavas-me João – porque dizias que a tua língua não se te dava para pronunciar o meu nome. Com diminutivo, para distinguir dos dois Joões da família, embora do terceiro o problema persistisse. O nome da minha irmã, mais comprido e aparentemente mais complicado, não apresentava nenhum problema.
Indignavas-te com o meu cabelo de recém-entrado na adolescência, mais comprido do que o habitual. Amanhã madrugas e vais cortar o cabelo, ouvi-te dizer com ar muito sério e preocupado. Respondia-te que sim mas que também.
Lá em casa havia sempre animais. Mesmo nunca tendo visto o rebanho sem ser em fotografias, vi as burras no palheiro, os coelhos, as galinhas ao fundo do casarão. E os cães e gatos. Os teus cães nunca tinham pulgas, mesmo que, à vista desarmada, fosse possível vislumbrar minúsculas coisas pretas aos saltos no lombo do bicho.
Quem te conheceu mais novo explicou-me como tu eras um homem bom e generoso. Muito social e hospitaleiro. Ninguém passava pela porta de tua casa sem se sentar à mesa. Aliás, se ninguém se sentasse à mesa contigo, recusavas-te a comer. Um dos Joões bem se lembra da série de noites em que repetia o jantar porque, quando chegavas mais tarde do que todo os outros das tarefas quotidianas, querias companhia.
No meu tempo, era diferente. Lembro-me que precisavas da atenção que precisam os velhos. À mesa, era um castigo fazer-te comer o que quer fosse. Era sempre muito, não se te podia pôr nada no prato. Não fosse o teu respeito pela nora de Lisboa e as artimanhas dela e os filhos, com demasiadas falinhas mansas, não se teriam arranjado melhor.
Um dia estava uma daquelas luas quentes de verão, alaranjadas, o ar quase não corria, como é costume nessa altura do ano. O tempo vai mudar, disseste sentado na cadeira de lona que estava na varanda. Agora sei que era mais a tua vontade de que mudasse do que um qualquer tipo de intuição ou sabedoria meteorológica apurados ao longo dos anos.
Sábado, a chuva trucidou uns quinze dias, três semanas de sol consecutivos. O tempo mudou com a mudança da lua. Lembrei-me de ti.
Indignavas-te com o meu cabelo de recém-entrado na adolescência, mais comprido do que o habitual. Amanhã madrugas e vais cortar o cabelo, ouvi-te dizer com ar muito sério e preocupado. Respondia-te que sim mas que também.
Lá em casa havia sempre animais. Mesmo nunca tendo visto o rebanho sem ser em fotografias, vi as burras no palheiro, os coelhos, as galinhas ao fundo do casarão. E os cães e gatos. Os teus cães nunca tinham pulgas, mesmo que, à vista desarmada, fosse possível vislumbrar minúsculas coisas pretas aos saltos no lombo do bicho.
Quem te conheceu mais novo explicou-me como tu eras um homem bom e generoso. Muito social e hospitaleiro. Ninguém passava pela porta de tua casa sem se sentar à mesa. Aliás, se ninguém se sentasse à mesa contigo, recusavas-te a comer. Um dos Joões bem se lembra da série de noites em que repetia o jantar porque, quando chegavas mais tarde do que todo os outros das tarefas quotidianas, querias companhia.
No meu tempo, era diferente. Lembro-me que precisavas da atenção que precisam os velhos. À mesa, era um castigo fazer-te comer o que quer fosse. Era sempre muito, não se te podia pôr nada no prato. Não fosse o teu respeito pela nora de Lisboa e as artimanhas dela e os filhos, com demasiadas falinhas mansas, não se teriam arranjado melhor.
Um dia estava uma daquelas luas quentes de verão, alaranjadas, o ar quase não corria, como é costume nessa altura do ano. O tempo vai mudar, disseste sentado na cadeira de lona que estava na varanda. Agora sei que era mais a tua vontade de que mudasse do que um qualquer tipo de intuição ou sabedoria meteorológica apurados ao longo dos anos.
Sábado, a chuva trucidou uns quinze dias, três semanas de sol consecutivos. O tempo mudou com a mudança da lua. Lembrei-me de ti.
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