quarta-feira, dezembro 15, 2004

Para os aprendizes de feiticeiro – improvisar pode ser algo de muito difícil, física e psicologicamente esgotante. A desistência pode estar somente a uns passos de distância, a frustração sempre presente. Porquê? Porque, como em (quase) tudo na vida, há uma série de regras que são necessárias cumprir.

Tem de soar bem e aqui não há volta a dar. Porque raio hei-de eu ouvir algo que fira os meus ouvidos…? E, para soar bem, é preciso ter em conta o que está subjacente a cada improviso. Há um tema, que introduz uma conversa, um mote e há uma estrutura, que é como se fosse uma base comum que permite o diálogo, uma língua.

Ou seja, para os improvisadores assim-assim, estas características são, normalmente, um espartilho. Obrigam a pensar, a ter cuidado com a passagem harmónica que se segue, com a nota do topo, com o facto de que facilmente se entra na lógica de debitar notas dentro de um contexto harmónico sem qualquer tipo de conteúdo. O músico wannabe não se liberta do jugo da estrutura da música, não consegue soltar-se, toca demasiado em função dela.

Depois há os músicos a sério. Para mim, o melhor exemplo do discurso coerente, lógico, sem espartilho, é o de Miles. Toca como se nada o afectasse, como se estivesse no café a falar com o amigo, como se nada o pudesse impedir de, em determinado momento, dizer o que tinha pensado dizer. Passa por cima dos obstáculos com a leveza dum verdadeiro mestre.

A dada altura, parece que é o tema que se molda por forma a acompanhá-lo