Está mais velho e gordo – desde a primeira vez que me lembro de o ver. Os dentes são menos e mais gastos e destruídos. Agora até deixou crescer a barba grisalha e nota-se mais que coxeia. Mas continua a levar o mesmo saco muito amarelo com Cais escrito a preto onde guarda as revistas à tiracolo pelo lado esquerdo, enquanto passeia alguns exemplares na mão direita, apoiados contra o peito.
Nunca lhe comprei nenhuma revista. Não simpatizo com a cara dele. Um dia, há uma meia dúzia de anos atrás, vinha num daqueles bancos que estão virados frente a frente com uma namorada da altura e duas amigas e ele passou. Disse qualquer coisa que eu não entendi de momento porque não pensei que fosse comigo. Só quando comecei a ouvir os demais amigos que iam noutros bancos da mesma carruagem percebi que se dirigia a mim. Chamou-me qualquer coisa como “cão” porque ia rodeado de “cadelas”. Enfim, não me lembro ao certo mas não era. Mas tenho a certeza de que não era um comentário de todo simpático.
Normalmente, tenho o meu livro em riste quando passa por mim, a não ser que vá acompanhado na viagem. São poucas as vezes em que chega sequer a tentar vender-me o seu ganha-pão: o alvo primário são senhoras de meia-idade, mais facilmente impressionáveis, presumo.
Por vezes, se a carruagem está vazia quando passa, acaba por ter de se contentar comigo. Invariavelmente digo-lhe não, obrigado, levantando os olhos das linhas do meu romance e olhando-o de frente, fixado na cara enrugada e com um quase esgar de dor bem elaborado, fruto de anos após anos de metier, de desenvolvimento do seu savoir faire.
Normalmente, fica zangado. Achar-me-á ríspido, por ventura. Não o censuro, é provável que seja mesmo. A verdade é que resulta, porque também invariavelmente se afasta resmungando suficientemente alto uma série de impropérios e palavras de cariz duvidoso em forma de ladaínha.
Nunca lhe comprei nenhuma revista. Não simpatizo com a cara dele. Um dia, há uma meia dúzia de anos atrás, vinha num daqueles bancos que estão virados frente a frente com uma namorada da altura e duas amigas e ele passou. Disse qualquer coisa que eu não entendi de momento porque não pensei que fosse comigo. Só quando comecei a ouvir os demais amigos que iam noutros bancos da mesma carruagem percebi que se dirigia a mim. Chamou-me qualquer coisa como “cão” porque ia rodeado de “cadelas”. Enfim, não me lembro ao certo mas não era. Mas tenho a certeza de que não era um comentário de todo simpático.
Normalmente, tenho o meu livro em riste quando passa por mim, a não ser que vá acompanhado na viagem. São poucas as vezes em que chega sequer a tentar vender-me o seu ganha-pão: o alvo primário são senhoras de meia-idade, mais facilmente impressionáveis, presumo.
Por vezes, se a carruagem está vazia quando passa, acaba por ter de se contentar comigo. Invariavelmente digo-lhe não, obrigado, levantando os olhos das linhas do meu romance e olhando-o de frente, fixado na cara enrugada e com um quase esgar de dor bem elaborado, fruto de anos após anos de metier, de desenvolvimento do seu savoir faire.
Normalmente, fica zangado. Achar-me-á ríspido, por ventura. Não o censuro, é provável que seja mesmo. A verdade é que resulta, porque também invariavelmente se afasta resmungando suficientemente alto uma série de impropérios e palavras de cariz duvidoso em forma de ladaínha.
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