Vou fazer um auto-plágio. Contexto: troca de mails acerca do concerto do Mehldau de sexta-feira no CCB. Fui interrogado com algum tacto, pés de lã de quem faz uma pergunta retórica estilo não gostaste muito, pois não? A inspiração tem destas coisas, nem sempre surge. Eu, que ainda não tinha tido o tempo mental para escrever sobre o que ouvi e vi, escrevi. Com pouco tempo físico, mas escrevi.
Vou-me abster de fazer correcções ao texto, vai cru como os mails devem ser. Ipsis verbis. Apenas corrigi uma palavra que reparei que estava mal escrita. Para além disso, vou pôr aspas a mim próprio, fica bonito.
«[A propósito do terceiro encore da noite, o Tune Up, do qual demorei imenso tempo a lembrar] Saí de lá com aquilo na cabeça sem conseguir chegar ao nome do raio do tema. Enfim, lembrei-me com alguma (muita) ajuda do Público. E ainda tocou um blues qualquer que é suposto eu conhecer.
[Dirigindo-me à pergunta] Não... Confesso. Primeiro que tudo, um problema de expectativas. Eu fui para lá com a perspectiva de levar uma valente sova, na onda do Art of the Trio, de música frenética, dura de ouvir, cansativa, muito tensa, rija. Queria ouvir standards transfigurados, tocados em compassos alterados, levados ao extremo. E originais, para o mesmo efeito tanto dá, standards é mais giro porque apercebes-te da reviravolta que levaram. Isto porque quando eu penso no Mehldau isso é a primeira coisa que me vem à cabeça.
É perfeitamente lícito que ele se vire para versões, covers, pop. Tudo bem, não me escandaliza minimamente. Agora, independentemente do meu desajuste de expectativas, o que não é nada lícito é que o tipo se torne sensaborão, chato, monótono. Juro-te que pensei que era eu que estava armado em parvo quando vejo toda a gente a ir ao rubro e eu não estava a achar nada de especial. Pensei: estás cansado, estás com fome, não são as condições ideais para ver isto. Eh pá, mas com a secção rítmica a tocar a um tempo rapidíssimo, mesmo a pedir para partir aquilo tudo, e ao mesmo tempo ver o caramelo a dar meia dúzia de notas dissonantes sem graça nenhuma, sem discurso, sem lógica... Só resultou nas baladas e na intro.
Doeu-me. Confesso. Ia ver outra vez, mesmo tocando mal continua a ser um grande espectáculo. Tecnicamente, sobretudo. É mais ou menos como o Federer, jogando abaixo daquilo que é capaz continua a ganhar Slams. Mas não invalida que me fique a saber a muito pouco. E acho que é essa coisa da inspiração é um bode expiatório com costas muito largas. Um músico a sério não pode contar com a inspiração para salvar a honra do convento; isso é para nabos como eu. Tem que tocar bem, ponto final. Pode ter um dia em que está mais onfire. Mas o que eu vi na 6a não é "atribuível" a uma inspiração nas ruas da amargura. Eu acho que é falta de preparação. Que é como quem diz, profissionalismo. Por muito pouco prosaico e simpático que isto possa ser, a dita inspiração trabalha-se.
[em resposta à quase-pergunta em relação ao Grenadier] (Eu gostei mais do Ballard, acho que foi o único que puxou aquilo verdadeiramente para a frente. Mas isto também sou eu que tenho alguma dificuldade com os baixistas modernos)
E pronto, escrevi um mail gigantesco que vai fazer as vezes do post que queria pôr online e ainda não tinha saído.»
Vou-me abster de fazer correcções ao texto, vai cru como os mails devem ser. Ipsis verbis. Apenas corrigi uma palavra que reparei que estava mal escrita. Para além disso, vou pôr aspas a mim próprio, fica bonito.
«[A propósito do terceiro encore da noite, o Tune Up, do qual demorei imenso tempo a lembrar] Saí de lá com aquilo na cabeça sem conseguir chegar ao nome do raio do tema. Enfim, lembrei-me com alguma (muita) ajuda do Público. E ainda tocou um blues qualquer que é suposto eu conhecer.
[Dirigindo-me à pergunta] Não... Confesso. Primeiro que tudo, um problema de expectativas. Eu fui para lá com a perspectiva de levar uma valente sova, na onda do Art of the Trio, de música frenética, dura de ouvir, cansativa, muito tensa, rija. Queria ouvir standards transfigurados, tocados em compassos alterados, levados ao extremo. E originais, para o mesmo efeito tanto dá, standards é mais giro porque apercebes-te da reviravolta que levaram. Isto porque quando eu penso no Mehldau isso é a primeira coisa que me vem à cabeça.
É perfeitamente lícito que ele se vire para versões, covers, pop. Tudo bem, não me escandaliza minimamente. Agora, independentemente do meu desajuste de expectativas, o que não é nada lícito é que o tipo se torne sensaborão, chato, monótono. Juro-te que pensei que era eu que estava armado em parvo quando vejo toda a gente a ir ao rubro e eu não estava a achar nada de especial. Pensei: estás cansado, estás com fome, não são as condições ideais para ver isto. Eh pá, mas com a secção rítmica a tocar a um tempo rapidíssimo, mesmo a pedir para partir aquilo tudo, e ao mesmo tempo ver o caramelo a dar meia dúzia de notas dissonantes sem graça nenhuma, sem discurso, sem lógica... Só resultou nas baladas e na intro.
Doeu-me. Confesso. Ia ver outra vez, mesmo tocando mal continua a ser um grande espectáculo. Tecnicamente, sobretudo. É mais ou menos como o Federer, jogando abaixo daquilo que é capaz continua a ganhar Slams. Mas não invalida que me fique a saber a muito pouco. E acho que é essa coisa da inspiração é um bode expiatório com costas muito largas. Um músico a sério não pode contar com a inspiração para salvar a honra do convento; isso é para nabos como eu. Tem que tocar bem, ponto final. Pode ter um dia em que está mais onfire. Mas o que eu vi na 6a não é "atribuível" a uma inspiração nas ruas da amargura. Eu acho que é falta de preparação. Que é como quem diz, profissionalismo. Por muito pouco prosaico e simpático que isto possa ser, a dita inspiração trabalha-se.
[em resposta à quase-pergunta em relação ao Grenadier] (Eu gostei mais do Ballard, acho que foi o único que puxou aquilo verdadeiramente para a frente. Mas isto também sou eu que tenho alguma dificuldade com os baixistas modernos)
E pronto, escrevi um mail gigantesco que vai fazer as vezes do post que queria pôr online e ainda não tinha saído.»
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