sábado, abril 30, 2005

Stamford Bridge – o umbigo do mundo.

terça-feira, abril 26, 2005

Mais uns tempos passaram -, mais uma série de e-mails de pessoal de Vera Cruz me foram dirigidos. Erradamente, como é sabido. Quem se sentir fora de contexto, é favor dar uma saltada até à posta de 12 de Novembro do ano passado. Cá vai alho, bem numeradinho:

1. «iai lindinhu ?comc vc ta?vi teu irmao e o patrick no chalaça esses
tempos
so faltou vc....qdo der me manda
noticias ah o meu anel gostou de moscou?hehehehe.bjinhussss rafa

2. «oi meu amorduxo,q saudades d ti .Estou saindo direto c/o Biro.M liga XXXXXXXX e XXXXXXXX (censura minha).Estou solteiríssima e doida d saudades suas.Bjs Lu(gravataí)»

3. «VO TE POR NO TICOSPLA, TO COM SAUDADES SEU TRATANTE. UM BEIJO
ENORMEEEEEEEEE.DANI.»

4. «Oi Daniel,
Ontem t vi no 2 toques, e não acreditei em t ver de volta pra
poa!!!!!!!!!!!!!!
Apesar das circunstâncias (da tua lesão), é muito bom te ver pela
cidade!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Bem, espero ter a oportunidade de te conhecer pessoalmente!!!!!!!!! :)
Nem q seja pra vc autografar minha camisa do Inter!!!!!!!!!!!!!!!
Espero meeeeesmo t conhecer... qq coisa, meu telefone é XXXXXXXXX (censura minha).
Bjussssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssss»

5. «oi dani sou eu margo tudo bem,fique super feliz com seu telefonema mas
meu fone tem problemas na bateria ele tem que ficar carregando
direto,mas me escreve nao quero perder o contato com vc.beijinhos»

6. «oi lindooooooo q saudades,poxa m abandonou né?da nada só p/t lembrar meu niver dia 19/07...m liga XXXXXXXX (censura minha)...estou lhe aguardando.t cuida e fica c/DEUS »

A saga continua, como podem ver.

segunda-feira, abril 25, 2005

«Sim, tudo é relativo – Anda para aí uma teoria sobre a relatividade da importância de escolher as pessoas menos indicadas para os cargos mais importantes que, levada às últimas consequências, acabaria a sugerir a irrelevância das escolhas – entre pessoas, entre ideias, entre valores.

George W. Bush demonstrou que o Presidente da nação mais poderosa do mundo se permitia invadir um país estrangeiro com a recurso a pretextos forjado e mentiras, defendidas como verdades, perante o seu país, os aliados e as Nações Unidas. Mostrou também que era possível governar beneficiando os ricos e desprotegendo os pobres, sacrificando o ambiente a benefício de poderosas empresas, misturando os negócios de energia e de armamento com as missões de guerra e impondo a vontade soberana dos Estados Unidos contra convenções, acordos, fóruns multilaterais ou simples concertação de interesses com outras nações. Foi reeleito e, perante o desânimo geral, logo houve quem, apesar de não conseguir subscrever o grosso da “doutrina Bush” para o mundo, tenha vindo explicar que o seu segundo mandato iria ser diferente: aberto ao multilateralismo, ao diálogo, à cooperação. Continuamos à espera.

O mesmo Bush nomeou para embaixador americano na ONU alguém que defendera publicamente o fim da organização ou a sua reforma, reduzindo os membros permanentes do Conselho de Segurança a um apenas: os próprios Estados Unidos. Mas, precisamente porque esse era o seu pensamento, o embaixador John Bolton, conforme nos explicaram, estará no local certo para rever as suas ideias. E o mesmo nos disseram da escolha de Wolfowitz, líder ideológico da extrema-direita americana e mentor da “pacificação” do Iraque, onde lhe caberá defender o financiamento das ajudas ao desenvolvimento do Terceiro Mundo. Tal como Bolton, também ele já jurou que irá fazer o contrário do que defendeu até aqui.

Na Europa, a escolha por Durão Barroso do italiano Butiglione para comissário europeu levantou uma onda de protestos, fundada no currículo pouco recomendável deste ultraconservador católico, amigo pessoal e conselheiro de João Paulo II. Depois de ter forçado a sua escolha até ao ponto de ruptura, Barroso foi forçado a recuar, o que muito entristeceu aqueles que defendiam que se podia representar a Europa preconizando valores contrários àqueles que compõem o património adquirido dos europeus e o melhor da sua construção ideológica. Em todos os casos, apareceu sempre quem defendesse uma espécie de teoria absurda de que, quando pior é a escolha, quanto menos recomendável é o perfil do escolhido para determinado cargo, melhores são as perspectivas de trabalho. Porque, afinal, tudo será conciliável, tudo será relativo.

Ora, sejamos directos: a escolha do cardel Ratzinger para Papa foi a pior escolha possível dos cardeais. Foi, como alguém escreveu, a extrema-direita do Espírito Santo quem escolheu este homem que prega o valor absoluto da fé contra, imagine-se…, “a ditadura do relativismo”. Conhecendo-se as suas ideias e o seu percurso dentro da Igreja (em particular a sua transformação de teólogo do Vaticano II em perseguidor dos teólogos não-alinhados), só uma transformação radical impedirá que ele seja um Papa para dividir e não para unir – católicos e não-católicos. Não acrescentará o rebanho pela força da palavra e do Evangelho, como João XXIII, nem pelo carisma pessoal, como João Paulo II.

Mas não, já aí está quem nos explique que uma e outra pessoa não são a mesma: morreu o cardeal Ratzinger, o guardião da fé, o príncipe da intransigência e ressuscitou nele o Papa Bento XVI, um espírito novo, tolerante e aberto. E, para princípio de demonstração, aí está a sua comunicação do primeiro dia de papado, defendendo “a causa fundamental do ecumenismo”, em absoluto contraste com o seu anterior personagem que defendia que “fora da Igreja Católica não há salvação”.

Está dado o sinal para a transformação. Em breve haverá quem queira acreditar que Ratzinger-Papa irá restabelecer a importância das dioceses e das conferências episcopais, ou seja, da autonomia das igrejas nacionais, que, sob o papado de João Paulo II e sob directa influência de Ratzinger-cardeal e ao arrepio de Vaticano II, foram transformados em meros executores do pensamento e da orientação do Papa e da Cúria. E depois iremos ainda ver o novo Papa, contrariando tudo o que sempre fio o seu pensamento, abrir o diálogo nas questões fechadas: as questões da bioética, o controlo da natalidade, o celibato dos padres, o sacerdócio das mulheres. Porquê? Justamente porque ninguém o espera. Deve ser a isto que chamam milagres.

É inevitável, e não apenas provável, que os primeiros sinais enviados por Bento XVI sejam conciliadores e diplomáticos. Mas, a menos que ousássemos presumir a sua desonestidade intelectual e moral, nada autoriza imaginar que, uma vez Papa, Ratzinger se abstenha de dar à Igreja a orientação conforme ao seu pensamento. Eu creio mesmo que a sucessão em Ratzinger fazia parte do testamento transmitido a todos os cardeais por João Paulo II. E que o conclave que o escolheu – e em que todos ou quase todos os cardeais foram nomeados por João Paulo II – se limitou a funcionar como executor testamentário. A “eleição” de Ratzinger foi preparada de longe e ao detalhe, por ele e pelo seu antecessor, e só não foi mais rápida porque isso pareceria uma nomeação e não uma eleição. Este não será um Papa de transição, nem sequer de continuação: será um Papa de consolidação daquilo que de mais conservador e fechado existe na Santa Madre Igreja. Passados os primeiros tempos da diplomacia e da simpatia, Bento XVI dedicar-se-á, tão subtilmente quanto a sua brilhante inteligência augura, a deixar a Igreja amarrada à mais estrita ortodoxia, por longos e bons anos, desejadamente por séculos, até ao final dos tempos.

A meu ver, não há que procurar outras pistas, senão as que ele próprio deixou, no momento decisivo em que pronunciou a homília da missa que antecedeu o conclave. Não foi um discurso de circunstância nem de mais um entre 115 cardeais. Não foi sequer um discurso de candidato a Papa: foi o discurso de alguém reclamando uma herança, enunciando uma doutrina que, no final, colocava uma pergunta óbvia – “Quem, se não eu, pode executar esta política?”

E que doutrina é essa? É a de “um humilde servo de Deus” e que acredita que “o cristão é uma pessoa simples”, uma “gente sincera”, a quem os bispos “devem defender dos intelectuais”. E, entre outros males, os intelectuais pensam. E, ao pensarem, eles podem fazer com que essa gente simples se deixe arrastar “por aqui e por ali, por qualquer vento ou doutrina”, acabando-se numa “ditadura do relativismo, em que nada é definitivo”, como no tempo de Galileu, que ousou pensar que era a Terra que girava em torno do Sol.

Esse “relativismo” aplica-o Ratzinger às dúvidas que o homem, sujeito à lei da vida e à lei da morte, ousa ainda colocar, para além ou à margem dos mandamentos irrevogáveis da Igreja: quando começa e quando acaba a vida humana? Será desejável trazer ao mundo crianças deficientes ou condenadas ao sofrimento, podendo evitá-lo? Será desejável prolongar uma existência apenas clínica e vegetativa, onde a dignidade da própria vida já se extinguiu e nada mais resta do que uma crença doutrinária e um negócio hospitalar? Será humano, e cristão, continuar a defender a proibição do preservativo em sociedades dizimadas pela sida, em nome do mandamento de fé de que a sexualidade não existe como acto próprio e manifestação de amor, mas apenas como instrumento de procriação divina? Em nome de que benefícios pastorais (os malefícios, infelizmente, conhecemo-los bem demais…) se impõe o celibato aos padres? E em nome de que mandamento divino se excluem as mulheres do sacerdócio?
A este “relativismo”, que, segundo ele, não reconhece nada como valor absoluto, Ratzinger contrapõe o único valor absoluto: a fé. A fé de que não há salvação fora dos mandamentos da Igreja Católica. Mas os mandamentos, tal como ele os impõe, e não como os daqueles teólogos desviantes a cuja perseguição o novo Papa dedicou os últimos 25 anos da sua vida.

Mas o Papa está enganado: existe outra leitura do cristianismo e não é por ele a proibir que ela deixa de existir. E existem valores fora do cristianismo – noutras religiões ou em religião alguma. Não existe apenas a doutrina dele ou a ausência de quaisquer valores. Na Europa, que ele parece ter escolhido como seu terreno predilecto de combate, existem, pelo menos desde 1789, valores cívicos, políticos e éticos, que não são tributários da Igreja Católica e de que o comum dos europeus não está a fim de abdicar em nome da proposta “salvação única”. Como a pena de morte, que o agora Papa justificou em tempos, e que a Europa baniu há muito.»

Miguel Sousa Tavares, Público 23 de Abril de 2005

quinta-feira, abril 21, 2005

Queres saber porquê? Eu digo-te porquê, está descansada. Escusas de ficar com essa cara. Conto-te tudo, tudo e tudo. Sem censuras, tintim por tintim. Aproveitamos e acertamos as coisas, pomos tudo em pratos limpos, pomos os pontos nos “i”’s. Até porque já estou farto desta situação, estou farto da forma como as coisas andam.

E ficas já avisada, se não gostares do que tenho para dizer, azar. Se não querias ouvir, não me deverias ter perguntado nada. Mas já que fazes questão em me puxar pela língua, agora vais ouvir tudo até ao fim, não tolero interrupções. Se tiveres alguma coisa para dizer, memoriza e diz no fim. Se tens medo de te esquecer, escreve num papelinho, não me incomoda nada. Não quero é que me mandes à cara depois que não te dou hipótese de contestar.

De uma vez por todas vou deixar de me calar, deixar de engolir aquilo que me apetece dizer de cada vez que penso que, se abrir o bico, vou acabar por dizer alguma coisa desagradável, que tu não queres ouvir. Está mais que na hora de deixar de me armar em Gandhi, sempre preocupado com a reacção que os outros podem ter. E também está na hora de seres capaz de lidar com aquilo que eu penso.

Aliás, esse sempre foi o meu problema. Fiz tudo errado. A asneira é totalmente minha. Todo este tempo em que não abri a boca só contribuí para que te tornasses ainda mais mimada, egoísta, para que nunca fosses capaz de ver nada para lá do teu umbigo.

A culpa é toda minha. Sempre foi.

terça-feira, abril 19, 2005

Rezou a todos - os santinhos, toda a ladainha que conhecia de cor e salteado. A verdade é que estava preocupado, não sabia se conseguiria aguentar. Afinal, as preces foram ouvidas superiormente e a vontade foi-lhe feita. O conclave foi um dos mais curtos de sempre. Se não mesmo o mais. Vá-se lá saber. O que é certo é que Policarpo saiu imediatamente, assim que pôde e enfiou-se na primeira casa-de-banho que encontrou. E foi então que sacou do maço de Malboro Lights e saboreou lentamente a morte do jejum das últimas horas de calvário, de suplício.

Quem não soubesse, diria que até parecia o fumo branco a sair da chaminé da Capela Sistina…

domingo, abril 17, 2005

Em como um tipo radicado na Madeira - pode afirmar publicamente que rejeita uma lei emanada por um órgão de soberania do país dele uma vez que ataca os seus interesses. Engraçado, quando é para suportar os défices da gestão ruinosa, nada como alegar a condição de insularidade e obter o benefício de poder apresentar a factura de qualquer que seja o buraco financeiro.

Afundem-me esse gajo.
O melhor guarda-redes - que o Sporting alguma vez teve e ainda tem é, sem margem para dúvidas, o grande Bostinha.
A partir de amanhã –, vota Policarpo.
Há não muito tempo - , por volta da altura das eleições, ouvi o Jerónimo proferir, ainda a voz não o tinha atraiçoado, uma frase do género as pessoas que contribuem mais devem receber mais do Estado pelo facto de que, lá está, contribuíram mais. Se calhar é essa a razão pela qual não me custa tanto a encaixar este excerto de uma notícia que vi no Público on-line (na íntegra, aqui):

«Para o PCP, a introdução dos exames do 9º ano transformam o ciclo de ensino num "ciclo altamente selectivo, com potenciais factores de insucesso e abandono, num momento em que se deve caminhar decididamente para aumentar a escolaridade obrigatória para os 12 anos".»

Palavras para quê, é a equidade absoluta.

sábado, abril 16, 2005

Nestas coisas -, o júri parece sempre uma cambada de deuses, isolada do mundo do comum dos mortais por uma mesa pesada e imponente, o seu Olimpo. Têm folhas à frente, toda a informação que nos solicitaram está ali, bem como as garrafas de água e respectivos copos donde bebericam, intervalando os temíveis comentários que proferem, para não secar a garganta.

Quando entrou na sala, sentiu o peso da responsabilidade e das luzes em cima da sua presença. O bom dia que educadamente soltou, saiu meio esganiçado. Nos instantes em que os membros do júri falavam entre eles, aproveitou para se acalmar um pouco, incentivar-se, galvanizar-se com palavras de auto-confiança. Afinal, estava longe de ser a primeira vez que se via naquelas andanças.

O porta-voz da mesa dos magnânimos ia dirigir-se-lhe. Já mais compostinha, disse a si própria que tinha chegado o momento. Pediu-lhe que falasse um pouco acerca da sua experiência profissional, que explicasse em que vertentes da sua vida se inseria a música.

Eu sou a voz do Metro.

O júri entreolhou-se, curioso. Pediram-lhe que concretizasse.

Sabe aquela voz que indica as estações e as correspondências? Sou eu. Por exemplo, próxima estação, Martim Moniz. Outro exemplo, próxima estação, Praça de Espanha. Estes são os mais simples, há outras em que digo mais coisas. Por exemplo, próxima estação Baixa-Chiado, há correspondência com a linha azul. Também pode ser verde, depende do sentido em que se vai. Os que mais gosto são aquelas estações que têm muito para dizer. Próxima estação, Cais do Sodré, estação terminal; há correspondência com a linha de Cascais e com o transporte fluvial.

E depois há aquelas situações diferentes, fora do comum, como a do Túnel do Rossio. Senhores passageiros, lembramos que não se encontra em funcionamento a ligação com a linha de Sintra na estação dos Restauradores. Em alternativa, poderão utilizar as estações de Entrecampos e Jardim Zoológico.


Chega de conversa, disseram-lhe, já temos uma ideia, agora queremos é cante.

Pigarreou um pouco para aclarar a garganta, respirou fundo para se concentrar, tentou ver mentalmente a letra à sua frente, para garantir que não se esqueceria de nada. E começou, com a toda a genica e garra, a soltar sons e notas da sua boca. Durou pouco mais do que vinte, trinta segundos. O porta-voz disse-lhe que tinha cantado o suficiente, não era necessário mais. Depois foi a vez de ele próprio aclarar a sua garganta e começar:

Olhe, eeerrrrr... eu vou ser perfeitamente honesto consigo. Aliás, vamos todos. Você não reúne nem de perto nem de longe as características ou os dons vocais, se quiser, que nós estamos aqui à procura. Antes de ter vindo aqui ao programa, devia ter-se olhado mais ao espelho enquanto cantava, ter pedido a opinião de pessoas que lhe respondessem honestamente, e não amigos que lhe dissessem que gostam muito de a ouvir apenas porque são mesmo seus amigos. A verdade é que você não canta bem, desafina, não tem ritmo, não tem presença, tem muito que aprender ainda. Não desanime, tente aprender, continue a tentar.

sexta-feira, abril 15, 2005

Talvez seja o pinhal - que faça o cheiro diferente. Ou talvez não, também há pinheiros onde moro e o odor não é o mesmo. Talvez seja o cheiro dum calor mais forte, mais constante, de um tempo mais seco. Surge mais ou menos onde começa o Alentejo. Progride até ao Algarve, mesmo até ao limite da água, nos sítios onde a pressão urbanística e os lobbies camarários e do betão ainda não destruíram por completo as zonas costeiras.

As minhas recordações remontam até à infância. A tradicional viagem de família às costas. Mais às costas da família, na altura. A nacional era feita a passo de caracol, com a avalanche de urbanos que invadiam as praias na mesma altura do ano, no pino do calor. Não havia ar condicionado nos carros e toda a gente parava para comer um cozido à portuguesa ou um prego no Canal Caveira.

Agora, a A2 não acaba em Alcácer. Nem em Grândola. Vai até lá abaixo. Até à outra, a tal de Via do Infante, que liga barlavento e sotavento num corredor cheio de altos e baixos de piso duvidoso. Não impede que, por vezes, seja necessário fazer a deslocação a velocidades de antigamente. Que o diga o meu carro, que se começou a queixar de um problema de saúde mal resolvido à saída da estação de serviço de Aljustrel, ainda com a zona das serras algarvias por fazer.

Gosto do sotaque. Gosto de “marafado”, “alcagoitas”, “vou à da minha tia” e “o mê filhe é de Legus”. Gosto do mar, das praias. Gosto das casas com terraços, caiadas e com linhas coloridas, das chaminés originais. Gosto da caldeirada, do peixe, das conquilhas ou cadelinhas. Dos povoados pitorescos. Tenho pena de não gostar dos Dom Rodrigos e dos doces de amêndoa.

Não gosto do caos e pressão urbanísticos. Não gosto de ter um desgosto de cada vez que regresso a um sítio que conheço e que foi ainda mais mutilado por mais um mamarracho. Não gosto da excessiva aposta num turismo exótico, de baixa qualidade que aposta em preços reduzidos. Não gosto da enchente de bifes que faz de Albufeira no verão a segunda cidade no mundo com mais ingleses, logo a seguir a Londres.

Mas gosto de regressar.
Sinceros parabéns - à lagartada. Grande jogo. Boa sorte para os que faltam.

quinta-feira, abril 14, 2005

Não é só mais um “oito mil”. É o quinto mais alto “eightthousander”. Para o Garcia, vai ser o sexto, depois de Cho Oyu, Dhaulagiri, GII e GI, para o único português a pisar o tecto do mundo, o fatídico Evereste. Para Hélder Santos, o primeiro. A primeira expedição portuguesa totalmente independente aos Himalaias.

Lhotse, o irmão ofuscado do Evereste. Uma quase relação do estilo Mozart versus Salieri. Ainda mais impressionante: na calha, ao que parece, está o K2. Para edições futuras. O terceiro cume mais perigoso deste grupo restrito que dos que se erguem mais alto, quando medido em termos das tentativas bem sucedidas de lá chegar em relação ao número de mortes no processo. Pior, só mesmo o Annapurna e o Nanga Parbat.

Toda a história, relatos, diários dos elementos da expedição, informações sobre os 14 oito mil, aqui.
O aviso de texto desconcertante – foi inventado ontem por motivos de força maior. Perante a evidência de um escrito que, de facto, não há como negá-lo, é desconcertante, tomei a liberdade de adoptar este rótulo, que será empregue novamente em situações de semelhante calibre, sempre que o disparate assim o exija.

quarta-feira, abril 13, 2005

Aviso – Texto Desconcertante

E ao sétimo dia - resolveu descansar, numa esplanada ao sol de fim de tarde, com um café e companhia feminina. Estava um pouco cansado. Não aquele cansaço físico de quem precisa de se esticar no sofá porque havia dormido uma boa noite. Tratava-se daquele cansaço da saturação da repetição de uma tarefa até à exaustão, ad nauseam.

De repente, no meio da conversa choveu um indiano de rosas em riste e pequenos aparelhos luminosos à volta das orelhas. E que não aceitava não como resposta. Continuava a insistir com as flores a bater em cima da mesa, cavalheiro que é cavalheiro oferece rosas a uma senhora, ainda por cima se partilhar uma mesa com ela. Exaltou-se, saltou-lhe a tampa:

Ouça, passei a semana toda a trabalhar, não descansei um bocado, quase não comi, quase não dormi. Estou farto de pessoas à minha volta a chatear-me, a única coisa que queria era que me deixassem em paz ao menos no meu dia de descanso. Sim, não sei se reparou, mas hoje é domingo, dia em que as pessoas não devem trabalhar, devem aproveitar para fazer outro tipo de coisas, entre as quais se contam descansar da confusão da semana de trabalho.

Quer dizer, ainda por cima, não é para me gabar, longe de mim ser arrogante, se não fosse eu, não existiria esta esplanada onde você tão insistentemente tenta fazer negócio, não existiria a clientela que tenta assediar. Nem sequer existiriam as rosas que tenta vender. Eh pá, nem sequer existiria você!

Silêncio aterrador. Seguiu, como que a tentar passar um pano por cima da nódoa.

Eu sei a culpa é minha, escusa de dizer. Fico é desde já a saber que está na hora de rever as minhas criações.

O indiano foi-se embora a chorar.

terça-feira, abril 12, 2005

Adoro som. Adoro ouvir o vento a esbarrar-se contra os vidros, o mar a mandar-se sobre a areia, os pássaros acordam-me na manhãs de Primavera. Adoro o som de uma cafeteira quando o café está a subir, do ronronar de um gato com fome, das teclas de um piano abafado. Adoro o som de pessoas de idade que contam pausada e saudosamente histórias, de uma respiração acelerada, o batimento do coração.

Detesto ruído. Tique-taques de relógios, apitos do microondas, locais de construção, aceleras que rasgam a estrada, tacões em soalho de madeira. Detesto as pessoas que falam muito alto, os cães que ladram desalmadamente. Detesto os carros modernos que desatam a apitar se o cinto do condutor não está colocado.

Alguns ruídos irritantes não podemos controlar. É fácil lembrarmo-nos se o vizinho tinha o televisor alto ou o puto do lado resolveu fazer um ensaio com a banda de heavy metal. Mas quantas vezes nos lembramos do barulho do metro que também temos de aturar, do simples barulho da refrigeração do computador que, horas a fio, fica a remoer no fundo dos tímpanos?

Por muito estranho que possa eventualmente parecer, o ruído é altamente silencioso, entra pela nossa vida a dentro sem, muitas vezes se anunciar. Tão habituados estamos a ele que o nosso cérebro se concentra apenas naquilo que considera importante e tenta, a todo o custo, filtrar o supérfluo, uma tarefa que nos faz chegar a casa ao fim do dia cansados.

Como se não bastasse a chinfrineira a que temos de estar sujeitos, há tipos que gostam de nos arranjar ainda mais. Os do Metropolitano de Lisboa, por exemplo, resolveram vender espaço publicitário à Media Capital Outdoor. Que não faz a coisa por menos. Pequenos blocos de notícias em ecrãs de plasma nas estações, que intervalam os minutos de música e publicidade aos berros. Sempre igual, todos os dias os mesmos acordes. Nunca um comboio pareceu demorar tanto tempo a chegar à estação como agora. A única hipótese de não ouvir aquela porcaria é fazendo ainda mais barulho, ou concentrá-lo em phones nos ouvidos.

Em contraposição: ocorre-me o metropolitano de Moscovo. Com as suas galerias enormes e profundas, ornamentadas, com pinturas, esculturas e outras formas de arte. É um sistema antigo, fica bastante atulhado à hora de ponta. Mas só tenho mesmo de ouvir o que não pode deixar de ser, o ruído decorrente da movimentação.

O movimento de venda de espaços para publicidade nas universidades americanas foi de uma agressividade sem paralelo. Refrigerantes, marcas desportivas de sapatos e de roupa invadiram por completo lugares que deveriam ser baluartes de alguma calma e reclusão necessárias à aprendizagem. Será este o ponto a que chegarão estes serviços públicos, francamente necessitados de financiamento?

Espero pelo dia em que façam das estações do metro uma autêntica perfumaria.

segunda-feira, abril 11, 2005

Acerca da ténue linha – que separa a arrogância da falsa modéstia.

domingo, abril 10, 2005

Jane - lost her husband almost four years ago and still hasn't gotten out of her mourning stage. Her daughter constantly urges her to get back into the dating world. Finally, Jane says she'll go out, but doesn't know anyone. Her daughter immediately replies, "Mama! I have someone for you to meet." Well, it's an immediate hit. They really like one another and after dating for six weeks, he asks her to join him for a weekend in the mountains.

Their first night there, she undresses as does he. There she stands nude except for a pair of black lacy panties, while he is in his birthday suit.

Looking at her he asks, "Why the black panties?" She replies, "My breasts you can fondle, my body is yours to explore, but down there I am still in mourning." the following night the same scenario. She's standing there with the black panties on and he is in his birthday suit... except that he has a black condom over his erection. She looks at him and asks, "What's with the black condom?" He replies,

"I want to offer my deepest condolences."

quarta-feira, abril 06, 2005

A cadeira dos dentistas – sempre foi comparável à das salas da pena capital americanas que vemos retratadas no filmes. Seja por injecção letal, seja por patanisca final. Mas também há coisas giras que se passam nesses antros de perdição.

A situação clássica de maior envergadura na ida ao dentista é a da perguntinha incómoda. Envolvente: sentado na cadeira, luz apontada ao dente, boca aberta, aspirador no canto a pressionar o lábio, instrumento metálico que bate ou raspa, olhos fixos e compenetrados na delicada operação, sensação de profundo desconforto e medo. De repente, a outra boca que não a nossa abre-se e pergunta algo como:

Então, que tal vai isso?
Os pais?
Está a doer?


A última sempre dá para responder com acenos de cabeça ou esgares de dor. Todas as outras são uma apologia à linguagem gestual.

terça-feira, abril 05, 2005

Aujourd’hui l’espace est splendide!
Sans mors, sans éperons, sans brides,
Partons à cheval sur le vin
Pour un ciel féerique et divin !

Comme deux anges que torture
Une implacable calenture,
Dans le bleu cristal du matin
Suivons le mirage lointain !

Mollement balancés sur l’aile
Du tourbillon intelligent,
Dans un délire parallèle,

Ma sœur, côte à côte nageant,
Nous fuirons sans repos ni trêves
Vers le paradis de mes rêves !


Charles Baudelaire

segunda-feira, abril 04, 2005

Dois factos - importantes a reter sobre o Cristo Rei:

1 – Está de costas voltadas para a margem sul
2 – Parece que se vai suicidar no Tejo

domingo, abril 03, 2005

A warning sign

I missed the good part then I realised
I started looking and the bubble burst
I started looking for excuses
Come on in, I’ve gotta tell you what a state I’m in
I’ve gotta tell you in my loudest tones
That I started looking for a warning sign
When the truth is
I miss you
Yeah the truth is
That I miss you so

A warning sign
You came back to haunt me and I realised
That you were an island and I passed you by
And you were an island to discover
Come on in,I’ve gotta tell you what a state I’m in
I’ve gotta tell you in my loudest tones
That I started looking for a warning sign

And the truth is
I miss you
Yeah the truth is
I miss you so
And I’m tired
I should not have let you go

So I crawl back into your open arms
Yes I crawl back into your open arms
And I crawl back into your open arms
Yes I crawl back into your open arms.


Coldplay

sábado, abril 02, 2005

A única diferença - entre a morte dos papas e dos comuns mortais é que os primeiros, fruto da vida imaculada que levaram na terra, voam para o céu em executiva. Enfim, por isso e pelo facto de terem o equivalente a 31 voltas ao mundo em pontos no cartão de passageiro frequente. E têm um lugar à beira-mar à espera, com espreguiçadeira prontinha e cocktail tropical.

Nota – sim, é verdade, hoje estou particularmente corrosivo.
Provérbio – nem o papa morre nem a gente almoça
«Graças a ela enfrentei pela primeira vez o meu ser natural enquanto decorriam os meus noventa anos. Descobri que a minha obsessão de que cada coisa estivesse no seu lugar, cada assunto no seu tempo, cada palavra no seu estilo, não era o prémio merecido de uma mente ordenada mas, pelo contrário, um sistema completo de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, mas como reacção contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir a minha mesquinhez, que passo por prudente por ser pessimista, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que não se saiba que pouco me importa o tempo alheio. Descobri, por fim, que o amor não é um estado de alma mas um signo do Zodíaco.»

Memórias das minhas putas tristes, Gabriel García Márquez

sexta-feira, abril 01, 2005

Acima de tudo – sejam cristãos (e católicos) e deixem o papa morrer em paz. Para quem defende acerrimamente que a vida terrena não é senão uma etapa do total infinito, estão com demasiado receio.