sexta-feira, junho 30, 2006
quinta-feira, junho 29, 2006
«”Daddy’s going to kill you. He’s going to kill you,” she said.
I wasn’t listening though. I was thinking about something else – something crazy. ”You know what I’d like to be?” I said. “You know what I’d like to be? I mean if I had my goddam choice?”
“What? Stop swearing.”
“You know that song ‘If a body catch a body comin’ through the rye’? I’d like – “
“It’s ‘If a body meet a body coming through the rye’!” old Phoebe said. “It’s a poem. By Robert Burns.”
“I know it’s a poem by Robert Burns.”
She was right, though. It is “If a body meet a body coming through the rye.” I didn’t know it then, though.
“I thought it was ‘If a body catch a body,’” I said. “Anyway, I keep picturing all these little kids playing some game in this big field of rye and all. Thousands of little kids, and nobody’s around – nobody big, I mean – except me. And I’m standing on the edge of some crazy cliff. What I have to do, I have to catch everybody if they start to go over the cliff – I mean if they’re running and they don’t look where they’re going I have to come from somewhere and catch them. That’s all I’d do all day. I’d just be the catcher in the rye and all. I know it’s crazy, but that’s the only thing I’d really like to be. I know it’s crazy.”
Old Phoebe didn’t say anything for a long time. Then, when she said something, all she said was, “Daddy’s going to kill you.”»
The Catcher in the Rye, J.D.Salinger
I wasn’t listening though. I was thinking about something else – something crazy. ”You know what I’d like to be?” I said. “You know what I’d like to be? I mean if I had my goddam choice?”
“What? Stop swearing.”
“You know that song ‘If a body catch a body comin’ through the rye’? I’d like – “
“It’s ‘If a body meet a body coming through the rye’!” old Phoebe said. “It’s a poem. By Robert Burns.”
“I know it’s a poem by Robert Burns.”
She was right, though. It is “If a body meet a body coming through the rye.” I didn’t know it then, though.
“I thought it was ‘If a body catch a body,’” I said. “Anyway, I keep picturing all these little kids playing some game in this big field of rye and all. Thousands of little kids, and nobody’s around – nobody big, I mean – except me. And I’m standing on the edge of some crazy cliff. What I have to do, I have to catch everybody if they start to go over the cliff – I mean if they’re running and they don’t look where they’re going I have to come from somewhere and catch them. That’s all I’d do all day. I’d just be the catcher in the rye and all. I know it’s crazy, but that’s the only thing I’d really like to be. I know it’s crazy.”
Old Phoebe didn’t say anything for a long time. Then, when she said something, all she said was, “Daddy’s going to kill you.”»
The Catcher in the Rye, J.D.Salinger
quarta-feira, junho 28, 2006
Vais-me ligar?
Huumm, não sei, depende
Depende de quê?
Se me apetecer ligo.
Liga lá…!
Já te disse que não sei
Chata, não sejas assim
E tu vais-me atender se eu ligar?
(sorriso)
Depende, não sei.
Então para que é que queres que eu te ligue?
Pronto, eu atendo.
Se é para fazer essa cara de seca não quero.
Não é seca nenhuma, eu atendo.
Acho que afinal não me apetece mesmo
Então pronto, também não te respondo.
Huumm, não sei, depende
Depende de quê?
Se me apetecer ligo.
Liga lá…!
Já te disse que não sei
Chata, não sejas assim
E tu vais-me atender se eu ligar?
(sorriso)
Depende, não sei.
Então para que é que queres que eu te ligue?
Pronto, eu atendo.
Se é para fazer essa cara de seca não quero.
Não é seca nenhuma, eu atendo.
Acho que afinal não me apetece mesmo
Então pronto, também não te respondo.
terça-feira, junho 27, 2006
Matematizava tudo. Somava todas as suas experiências de vida e tentava dar-lhes um sentido, uma direcção, um vector que os orientasse. No limite para infinito, tudo para ele tinha uma extrapolação possível para a ciência dos números.
Pacífico, subtraía-se a agitações, multiplicava-se em desculpas para evitar confusões. Amigo do seu amigo, fraccionava o seu tempo para chegar a todos, dividia-se em papéis, adicionava-se facilmente a paródias.
Na sua vizinhança de raio épsilon, algumas ruas paralelas, outras perpendiculares, nos cruzamentos, nas intersecções, toda a gente o conhecia. Não falhava uma reunião, uma junção de conjuntos. Nessas alturas, mostrava as suas cónicas: contava parábolas, exagerava em hipérboles e descrevia círculos.
Era extremamente profissional. Perante desafios, formalizava problemas, equacionava soluções, elevava-se ao expoente máximo a maximizar as suas funções. E não se contentava com máximos locais, só globais. Para ele, não existiam restrições, mesmo que não activas. Integrava por partes, derivava resoluções.
Quando tudo parecia demasiado complexo, fora dos números reais, estabelecia condições de primeira ordem. Em última análise, primitivizava: quando as expressões são demasiado extensas, é necessário simplificar, levar tudo ao mesmo denominador e fazer os cortes possíveis.
Honesto e recto, integral e verdadeiro, culto e educado. O espectro dos seus interesses tinha uma elevada dispersão, uma variância astronómica. De ideias muito liberais, centrado nas suas convicções, era demasiado enviesado para poder ser representativo do indivíduo médio.
Tantos argumentos levaram a que um dia chegasse a um ponto de acumulação. Havia atingido o limite superior para o qual convergia agora assimptoticamente. Estava estagnado, sentia-se preso num intervalo fechado. Só lhe restava regredir. Começou de imediato a sentir-se obtuso, o seu ângulo de visão era cada vez mais agudo. Vinham-lhe à cabeça curvas decrescentes em referenciais cartesianos.
Resolveu fazer um ensaio de hipóteses. Descobriu que a probabilidade de ainda ter uma vida normal havia decaído, o intervalo de confiança afunilara. Vivia agora numa constante indeterminação que nem a regra de Cauchy/Hôpital conseguia simplificar.
Até que um dia percebeu que se estava a reduzir ao absurdo. Então, por contradição, achou-se provado.
Pacífico, subtraía-se a agitações, multiplicava-se em desculpas para evitar confusões. Amigo do seu amigo, fraccionava o seu tempo para chegar a todos, dividia-se em papéis, adicionava-se facilmente a paródias.
Na sua vizinhança de raio épsilon, algumas ruas paralelas, outras perpendiculares, nos cruzamentos, nas intersecções, toda a gente o conhecia. Não falhava uma reunião, uma junção de conjuntos. Nessas alturas, mostrava as suas cónicas: contava parábolas, exagerava em hipérboles e descrevia círculos.
Era extremamente profissional. Perante desafios, formalizava problemas, equacionava soluções, elevava-se ao expoente máximo a maximizar as suas funções. E não se contentava com máximos locais, só globais. Para ele, não existiam restrições, mesmo que não activas. Integrava por partes, derivava resoluções.
Quando tudo parecia demasiado complexo, fora dos números reais, estabelecia condições de primeira ordem. Em última análise, primitivizava: quando as expressões são demasiado extensas, é necessário simplificar, levar tudo ao mesmo denominador e fazer os cortes possíveis.
Honesto e recto, integral e verdadeiro, culto e educado. O espectro dos seus interesses tinha uma elevada dispersão, uma variância astronómica. De ideias muito liberais, centrado nas suas convicções, era demasiado enviesado para poder ser representativo do indivíduo médio.
Tantos argumentos levaram a que um dia chegasse a um ponto de acumulação. Havia atingido o limite superior para o qual convergia agora assimptoticamente. Estava estagnado, sentia-se preso num intervalo fechado. Só lhe restava regredir. Começou de imediato a sentir-se obtuso, o seu ângulo de visão era cada vez mais agudo. Vinham-lhe à cabeça curvas decrescentes em referenciais cartesianos.
Resolveu fazer um ensaio de hipóteses. Descobriu que a probabilidade de ainda ter uma vida normal havia decaído, o intervalo de confiança afunilara. Vivia agora numa constante indeterminação que nem a regra de Cauchy/Hôpital conseguia simplificar.
Até que um dia percebeu que se estava a reduzir ao absurdo. Então, por contradição, achou-se provado.
domingo, junho 25, 2006
sexta-feira, junho 23, 2006
Era a primeira vez - que olhava para a prateleira repleta, a rebentar pelas costuras. Diz-me o que ouves, dir-te-ei quem és. De repente, parou naquele sítio. Uma caixa azulada, no início da fileira.
Também tens isto?
Era o God Shuffled His Feet. Aproveitei a deixa e pus a tocar.
Once there was this kid who
Got into an accident and couldn't come to school
De repente, disse-me:
Às vezes sinto-me assim, como estes gajos.
Não percebi e isso deve ter-se notado na minha expressão meia atarantada porque ele acrescentou de imediato
Sinto-me um daqueles bonecos dos testes de segurança.
Houve ainda um breve hiato entre ouvir estas palavras e finalmente aperceber-me que ouvíamos os Crash Test Dummies.
But when he finally came back
His hair had turned from black into bright white
Já sabia do que falava, só faltava saber porquê. Possivelmente ainda com atarantamento na expressão, perguntei-lhe.
‘Tás aquela sensação de que vais fazer qualquer coisa que sabes que é uma asneira mas que, ao mesmo tempo, não consegues evitar?
Sim, sabia qual era a sensação. De antecipar o perigo e não conseguir esboçar uma reacção. Uma espécie de atracção do abismo, assustadora mas incontornável.
É assim que me sinto. Como se fosse um boneco que espera apaticamente o choque frontal contra uma parede de betão. Eu sei que ela está lá. E também sei que vou dentro de um carro em andamento e em rota de colisão. No entanto, não faço nada. Rigorosamente nada.
Imagens de bonecos com listas amarelas e pretas, projectados contra vidros partidos e chapa amolgada vieram-me à cabeça.
He said that it was from when
The car had smashed so hard
E depois os engenheiros retiram os corpos retorcidos dos escombros. Depois avaliam os danos infligidos.
Achas que é parvo? Achas que faz algum sentido.
Cocei a cabeça, não sabia o que lhe dizer. Então resolvi aproveitar a deixa da música que continuava, também ela impassível:
Mmm Mmm Mmm Mmm
Mmm Mmm Mmm Mmm
Também tens isto?
Era o God Shuffled His Feet. Aproveitei a deixa e pus a tocar.
Once there was this kid who
Got into an accident and couldn't come to school
De repente, disse-me:
Às vezes sinto-me assim, como estes gajos.
Não percebi e isso deve ter-se notado na minha expressão meia atarantada porque ele acrescentou de imediato
Sinto-me um daqueles bonecos dos testes de segurança.
Houve ainda um breve hiato entre ouvir estas palavras e finalmente aperceber-me que ouvíamos os Crash Test Dummies.
But when he finally came back
His hair had turned from black into bright white
Já sabia do que falava, só faltava saber porquê. Possivelmente ainda com atarantamento na expressão, perguntei-lhe.
‘Tás aquela sensação de que vais fazer qualquer coisa que sabes que é uma asneira mas que, ao mesmo tempo, não consegues evitar?
Sim, sabia qual era a sensação. De antecipar o perigo e não conseguir esboçar uma reacção. Uma espécie de atracção do abismo, assustadora mas incontornável.
É assim que me sinto. Como se fosse um boneco que espera apaticamente o choque frontal contra uma parede de betão. Eu sei que ela está lá. E também sei que vou dentro de um carro em andamento e em rota de colisão. No entanto, não faço nada. Rigorosamente nada.
Imagens de bonecos com listas amarelas e pretas, projectados contra vidros partidos e chapa amolgada vieram-me à cabeça.
He said that it was from when
The car had smashed so hard
E depois os engenheiros retiram os corpos retorcidos dos escombros. Depois avaliam os danos infligidos.
Achas que é parvo? Achas que faz algum sentido.
Cocei a cabeça, não sabia o que lhe dizer. Então resolvi aproveitar a deixa da música que continuava, também ela impassível:
Mmm Mmm Mmm Mmm
Mmm Mmm Mmm Mmm
quinta-feira, junho 22, 2006
Há muitos anos atrás – havia um anúncio na televisão ao Toffee Crisp. Em traços gerais, a publicidade queria atribuir a característica de leveza ao produto. E então aparecia um prisioneiro à nossa frente, dentro da sua cela. Comia deliciado o tal chocolate e, à medida que o fazia, ia começando a levitar. Cada vez mais até que, de tanto ascender, acabava por se evadir pela janela lá no alto da parede, impossível de atingir sem escadote.
Sinto que comi um Toffee Crisp.
Sinto que comi um Toffee Crisp.
Aprender – pode ombrear facilmente com as experiências mais dolorosas, desgastantes, frustrantes, injustas e ingratas que há. Mas tem a grande vantagem de, a espaços, poder ser das mais gratificantes.
quarta-feira, junho 21, 2006
A melhor parte - dos jogos deste Mundial é, sem sombra para quaisquer dúvidas, os comentários do Humberto Coelho na SIC. Ninguém senão ele para elaborar acerca do que se passa no campo. Senão vejamos, fica aqui um breve apanhado da minha laia.
As tácticas. Atacar pelas auas, com o Migueu e o Nuno Vauente a subir. Os extremos, aqueues que podem resouver porque criam desequíubrios: o Uuís Figo com a sua experiência e exceuente momento de forma; o Cristiano Ronauldo, com a sua veuocidade. Imparáveu no um-contra-um. Sem esquecer o Deco, que é fundamentau no meio campo. É assim que surgem espaços, uinhas de passe e cruzamentos na área. Auimentam o Pauueta que, no coração da área, remata para o gouo.
Há ainda outro tipo de alertas para os espectadores que não se apercebem destes pormenores. A reuva está auta, a boua desuiza pouco, por isso aqueua sucessão de passes falhados. Ainda outro tipo de conselhos e dicas: com o apuramento garantido, há que gerir as uesões, as fautas e os cartões amareuos. Mas tudo isto visando peuo menos empatar o úutimo jogo, para assegurar o primeiro uugar no grupo uma vez que a Argentina é um adversário temíveu. Será preferíveu defrontar a Houanda.
Com toda a emoção que coloca nas suas palavras, a partir de certa altura deixo de seguir o conteúdo das suas intervenções. É o alvoroço que me move e começo a imaginar o homem a vibrar intensamente com o jogo e, num ápice, levantar-se do banco, mandar o bloco de notas para o chão, e gritar em plenos pulmões:
Oooohhhh, Portugau auuuuuueeeeeezzzzzz…
Poortuugaaauu aauuuuuueeezzzz
Poortuugaaauu aauuuueezzzz
Poortuugaaauu aaauuuuuueeeeeeeeeezzzz
As tácticas. Atacar pelas auas, com o Migueu e o Nuno Vauente a subir. Os extremos, aqueues que podem resouver porque criam desequíubrios: o Uuís Figo com a sua experiência e exceuente momento de forma; o Cristiano Ronauldo, com a sua veuocidade. Imparáveu no um-contra-um. Sem esquecer o Deco, que é fundamentau no meio campo. É assim que surgem espaços, uinhas de passe e cruzamentos na área. Auimentam o Pauueta que, no coração da área, remata para o gouo.
Há ainda outro tipo de alertas para os espectadores que não se apercebem destes pormenores. A reuva está auta, a boua desuiza pouco, por isso aqueua sucessão de passes falhados. Ainda outro tipo de conselhos e dicas: com o apuramento garantido, há que gerir as uesões, as fautas e os cartões amareuos. Mas tudo isto visando peuo menos empatar o úutimo jogo, para assegurar o primeiro uugar no grupo uma vez que a Argentina é um adversário temíveu. Será preferíveu defrontar a Houanda.
Com toda a emoção que coloca nas suas palavras, a partir de certa altura deixo de seguir o conteúdo das suas intervenções. É o alvoroço que me move e começo a imaginar o homem a vibrar intensamente com o jogo e, num ápice, levantar-se do banco, mandar o bloco de notas para o chão, e gritar em plenos pulmões:
Oooohhhh, Portugau auuuuuueeeeeezzzzzz…
Poortuugaaauu aauuuuuueeezzzz
Poortuugaaauu aauuuueezzzz
Poortuugaaauu aaauuuuuueeeeeeeeeezzzz
terça-feira, junho 20, 2006
Gosto muito de dizer que não sou supersticioso. Mas depois levo quase sempre os mesmos dois, três CDs para ouvir no carro quando vou fazer um exame.
segunda-feira, junho 19, 2006
domingo, junho 18, 2006
No final do mês passado, fui ver uma das óperas mais brilhantes que existem, escrita por um dos tipos mais brilhantes que já existiu. O Anel de Nibelungo, a primeira parte de Das Rheingold, o Ouro do Reno.
À partida, uma ópera diferente, fora do clássico. Não há amores proibidos, tragédias de faca e alguidar, tipos mortos, suicídios e o espectáculo não acaba com uma gorda a cantar desalmadamente e a morrer de desgosto. Deixo o recado para quem acha que o J.R.R.Tolkien era um génio, muito imaginativo, original e criativo, deveria prestar mais atenção às obras do Wagner para descer um bocadinho à terra.
Esta breve introdução, embora tenha tergiversado para mandar a farpa aos amantes da trilogia do Senhor dos Anéis, serve apenas, como qualquer boa introdução que se preze, para introduzir o que verdadeiramente interessa: lembrei-me que me esqueci de refilar. Com o São Carlos.
As óperas à séria são no São Carlos. Quais mega operações no Pavilhão Atlântico, Traviatas e Flautas Mágicas, Coliseus, ou mesmo a célebre Aida no Estádio Nacional. É o mesmo que ver futebol num autódromo. E não é só pela sala em si e acústica, é também pela qualidade das produções, dos encenadores, dos músicos. Ou seja, também é o mesmo que ver Fórmula 1 disputada em triciclos.
Há uma ideia generalizada, com a qual os responsáveis da sala devem estar de acordo, de que não vale a pena fazer temporadas muito grandes, ter muito tempo em cartaz uma dada produção, muitas récitas. Isto porque não há público que justifique. O que faz todo o sentido, tendo em conta que os bilhetes esgotam num ápice assim que são postos à venda.
Não é o desfilar das figuras públicas e das elites em si que me irrita, também têm direito. E sempre vou achando graça ao provincianismo: é vê-los chegar todos engalanados, parece que estão à porta de uma igreja onde se vai celebrar um casamento. Tipos de smoking e tudo. A certa altura não contive o meu sorriso quando olhava para eles do alto da minha t-shirt e das minhas calças de ganga: estavam a morrer de calor de gravata, usavam o programa do espectáculo como leque improvisado.
O que me irrita é o facto de poucos comuns mortais terem o direito a passear nesse circuito muito fechado. Irrita-me esta deliberada vontade de manter o espectáculo da ópera encarcerado, voltado apenas para os umbigos das pessoas do jet set. O São Carlos não quer ser divulgador, pretende manter o status quo e ter na sua sala apenas a fina-flor da sociedade portuguesa.
Finalmente, o que me irrita até ao limite é ficar com a impressão que há muito tio e muita tia que vai à ópera só pelo happening social. Tenho sérias dúvidas que saibam apreciar minimamente a maravilha que estão a ver. Burros e pão-de-ló, pérolas e porcos. E até devem ter convites e bilhetes à borla, uma forma de garantir um bom ambiente dentro da sala.
À partida, uma ópera diferente, fora do clássico. Não há amores proibidos, tragédias de faca e alguidar, tipos mortos, suicídios e o espectáculo não acaba com uma gorda a cantar desalmadamente e a morrer de desgosto. Deixo o recado para quem acha que o J.R.R.Tolkien era um génio, muito imaginativo, original e criativo, deveria prestar mais atenção às obras do Wagner para descer um bocadinho à terra.
Esta breve introdução, embora tenha tergiversado para mandar a farpa aos amantes da trilogia do Senhor dos Anéis, serve apenas, como qualquer boa introdução que se preze, para introduzir o que verdadeiramente interessa: lembrei-me que me esqueci de refilar. Com o São Carlos.
As óperas à séria são no São Carlos. Quais mega operações no Pavilhão Atlântico, Traviatas e Flautas Mágicas, Coliseus, ou mesmo a célebre Aida no Estádio Nacional. É o mesmo que ver futebol num autódromo. E não é só pela sala em si e acústica, é também pela qualidade das produções, dos encenadores, dos músicos. Ou seja, também é o mesmo que ver Fórmula 1 disputada em triciclos.
Há uma ideia generalizada, com a qual os responsáveis da sala devem estar de acordo, de que não vale a pena fazer temporadas muito grandes, ter muito tempo em cartaz uma dada produção, muitas récitas. Isto porque não há público que justifique. O que faz todo o sentido, tendo em conta que os bilhetes esgotam num ápice assim que são postos à venda.
Não é o desfilar das figuras públicas e das elites em si que me irrita, também têm direito. E sempre vou achando graça ao provincianismo: é vê-los chegar todos engalanados, parece que estão à porta de uma igreja onde se vai celebrar um casamento. Tipos de smoking e tudo. A certa altura não contive o meu sorriso quando olhava para eles do alto da minha t-shirt e das minhas calças de ganga: estavam a morrer de calor de gravata, usavam o programa do espectáculo como leque improvisado.
O que me irrita é o facto de poucos comuns mortais terem o direito a passear nesse circuito muito fechado. Irrita-me esta deliberada vontade de manter o espectáculo da ópera encarcerado, voltado apenas para os umbigos das pessoas do jet set. O São Carlos não quer ser divulgador, pretende manter o status quo e ter na sua sala apenas a fina-flor da sociedade portuguesa.
Finalmente, o que me irrita até ao limite é ficar com a impressão que há muito tio e muita tia que vai à ópera só pelo happening social. Tenho sérias dúvidas que saibam apreciar minimamente a maravilha que estão a ver. Burros e pão-de-ló, pérolas e porcos. E até devem ter convites e bilhetes à borla, uma forma de garantir um bom ambiente dentro da sala.
sábado, junho 17, 2006
O grande problema - da organização de eventos mundiais é a miríade de culturas com as quais é preciso lidar convenientemente. Não se trata só de acalmar os ânimos quando há jogos que opõem dois países com clivagens históricas relativamente recentes, como a Alemanha e a Polónia, mas também atender a pormenores que podem fazer toda a diferença.
Imaginem o jogo de hoje. Apito inicial, o kick-off, tudo a correr bem, de preferência entramos a ganhar. Agora imaginem que, a páginas tantas, um almuadem fura o silêncio em grande estilo e, acto contínuo, os árabes do Irão sacam do tapete, estendem-no no chão, e depois procurarem a direcção certa para Meca e, de joelhos, entoam uns cânticos.
É este tipo de particulares que a FIFA tem que ter em consideração. Não marcar jogos à hora da reza.
Imaginem o jogo de hoje. Apito inicial, o kick-off, tudo a correr bem, de preferência entramos a ganhar. Agora imaginem que, a páginas tantas, um almuadem fura o silêncio em grande estilo e, acto contínuo, os árabes do Irão sacam do tapete, estendem-no no chão, e depois procurarem a direcção certa para Meca e, de joelhos, entoam uns cânticos.
É este tipo de particulares que a FIFA tem que ter em consideração. Não marcar jogos à hora da reza.
sexta-feira, junho 16, 2006
quinta-feira, junho 15, 2006
Estaria a mentir - se dissesse que tenho saudades tuas ou que sinto a tua ausência. Mas há um impulso que não me deixa apagar o teu número da agenda electrónica do meu telefone, embora saiba que nunca mais te poderei ligar.
As raras vezes que me lembro de ti acontecem ou quando encontro um amigo comum ou porque oiço o teu nome, mais abundante do que possa parecer à primeira vista, ser referido por alguém, aqui ou ali, num qualquer contexto.
À memória vêm-me uma série de imagens. Não exactamente por causa de ti. Limitas-te a despoletar-me as recordações de um determinado momento tão-somente porque estavas lá naquela altura. E porque a esse momento ficaste circunscrito.
Nunca percebi porque te foste, nem como escolheste ir. Nem sequer quero saber. Há decisões que só dizem respeito a cada um de nós, onde os outros não são perdidos nem achados.
Apenas espero que o motivo seja uma justificação plena. Porque não se desaparece assim sem mais nem menos, tão repentinamente. Deixando para trás um vazio estúpido.
Até eu, por vezes, tenho vontade de mergulhar outra vez de barriga nas tábuas do palco. De bata vestida.
As raras vezes que me lembro de ti acontecem ou quando encontro um amigo comum ou porque oiço o teu nome, mais abundante do que possa parecer à primeira vista, ser referido por alguém, aqui ou ali, num qualquer contexto.
À memória vêm-me uma série de imagens. Não exactamente por causa de ti. Limitas-te a despoletar-me as recordações de um determinado momento tão-somente porque estavas lá naquela altura. E porque a esse momento ficaste circunscrito.
Nunca percebi porque te foste, nem como escolheste ir. Nem sequer quero saber. Há decisões que só dizem respeito a cada um de nós, onde os outros não são perdidos nem achados.
Apenas espero que o motivo seja uma justificação plena. Porque não se desaparece assim sem mais nem menos, tão repentinamente. Deixando para trás um vazio estúpido.
Até eu, por vezes, tenho vontade de mergulhar outra vez de barriga nas tábuas do palco. De bata vestida.
quarta-feira, junho 14, 2006
É claro que o Kaká já devia ter percebido o que o nome dele significa em francês, escusava de estampá-lo nas costas e andar aí a exibi-lo estilo letreiro. Também é claro que há pior do que o caso dele. Ainda por cima português. Ora digam lá Futre com sotaque franciú.
A minha equipa - não só perdeu com a Coreia depois de ter estado a ganhar, como também está repleta de problemas internos e quezílias.
Vou repetir o teste e aldrabar as respostas.
Vou repetir o teste e aldrabar as respostas.
terça-feira, junho 13, 2006
Olhou escandalizada - para a caneta que eu tinha mão, com a publicidade de uma marca de que já não me lembro estampada no corpo branco. Achava-a indigna, não merecedora do nobre acto da escrita. Não transmite carisma, não permite personalizar a caligrafia. Só usava tinta permanente.
Detesto esferográficas.
Tirou-me o livro da frente. Virou-o para si, ajeitou-o. Abriu o estojo. Rodou a tampa preta, segurou delicadamente, o verniz das unhas polidas contrastava com a cor. E começou a escrever. Lentamente. Da mesma forma que a tinta se infiltrava nas fibras do papel.
Não toques.
Passado pouco tempo, secava.
No fim, a sucessão de letras sem sentido. Um estilo quase gótico, parecia o trabalho dum monge copista da idade média. Tive que dar o braço a torcer, disse que ficava bonito.
Mas não a deixei fugir sem lhe dizer que de prático não tinha nada, quem precisa de escrever rápido e não tem tempo para perder com mariquices não usa essas canetas.
Fez-me a cara de desapontamento, a cabeça a rodar lateralmente em sinal de desaprovação, soltou algumas vezes uns “tsss tsss”, pôs a mão no meu ombro.
Nunca te disseram que é tudo uma questão de prática…?
Detesto esferográficas.
Tirou-me o livro da frente. Virou-o para si, ajeitou-o. Abriu o estojo. Rodou a tampa preta, segurou delicadamente, o verniz das unhas polidas contrastava com a cor. E começou a escrever. Lentamente. Da mesma forma que a tinta se infiltrava nas fibras do papel.
Não toques.
Passado pouco tempo, secava.
No fim, a sucessão de letras sem sentido. Um estilo quase gótico, parecia o trabalho dum monge copista da idade média. Tive que dar o braço a torcer, disse que ficava bonito.
Mas não a deixei fugir sem lhe dizer que de prático não tinha nada, quem precisa de escrever rápido e não tem tempo para perder com mariquices não usa essas canetas.
Fez-me a cara de desapontamento, a cabeça a rodar lateralmente em sinal de desaprovação, soltou algumas vezes uns “tsss tsss”, pôs a mão no meu ombro.
Nunca te disseram que é tudo uma questão de prática…?
segunda-feira, junho 12, 2006
Do cachecol, da bandeira, da camisola, do ecran gigante, da esplanada, do convívio, do nervoso miudinho – Por favor, põe-te bom e depressa, Deco; Simão, corre para o banco e não saias de lá; Cristiano Ronaldo pá, puto, baixa a bolinha, tira o cavalinho da chuva; Figo, o meu chapéu está tirado da minha cabeça.
Adendas várias: da cerveja, dos tremoços, dos caracóis, das moelas, do pica-pau, da sande de coirato – Raios parta a trave, a cabeçada devia ter entrado, era o segundo e escusávamos de sofrer até ao fim. Ponham-se a brincar cá atrás ponham, a vossa sorte é que os tipos são tão cepos, umas tábuas do caraças, que não conseguem aproveitar.
Adendas várias: da cerveja, dos tremoços, dos caracóis, das moelas, do pica-pau, da sande de coirato – Raios parta a trave, a cabeçada devia ter entrado, era o segundo e escusávamos de sofrer até ao fim. Ponham-se a brincar cá atrás ponham, a vossa sorte é que os tipos são tão cepos, umas tábuas do caraças, que não conseguem aproveitar.
domingo, junho 11, 2006
Há dois tipos de grandes jogadores: os que só ganham em Roland Garros; os que ganham tudo o que há para ganhar excepto Roland Garros. Pronto, há mais um grupo, que é o dos que ganham em tudo, incluindo Roland Garros mas é tão pequeno (Roy Emerson, Rod Laver, Fred Perry, André Agassi e Don Budge) que por pouco nem dava para poderem jogar à sueca.
A imprensa e os críticos desportivos sempre atacaram e colocaram pressão sobre o Pistol Pete por este nunca ter levantado o troféu em Paris. Não foi por isso que deixaram de lhe chamar o melhor. E não um melhor qualquer. O de todos os tempos. Pudera. Quem se atreveria a mandar a primeira pedra ao maior coleccionador de taças de Grand Slam da história do desporto? Ele respondia apenas que não tinha nada a provar a ninguém.
Pessoalmente, acho que o Federer é ainda melhor que o americano de ascendência grega. Para além daquela capacidade inata de tirar o coelho da cartola quando é preciso, o suíço tem a técnica, a elegância, a souplesse que o tipo das sobrancelhas farfalhudas nunca teve. Talvez por isso, acho que ainda tem alguma coisa a provar.
Porque o resto, ele já o fez. Enfim, é certo que ainda “só” possui metade dos títulos do Sampras. Mas isso deve ser apenas uma questão de tempo, facilmente contornável para quem ainda vai a caminho do quarto de século. Para além de que isso é menos relevante, quem ganhou Wimbledon três vezes consecutivas não tem grande dificuldade em dizer que sabe jogar em relva.
E é aqui que entra a importância da final de hoje. Se Federer é de facto o jogador por excelência, terá que passar por cima do Nadal. Não tem outra hipótese. Se não o fizer, não será um Boris Becker que nunca ganhou nada em terra batida, é um facto. Mas arrisca-se seriamente a ser outro Sampras. Daqueles que, supostamente, não têm nada a provar.
O resto não interessa. Todos os outros records de que se fala são redundantes. Marcar presença na oitava meia-final de Slam consecutiva e chegar até ao Ivan Lendl, igualar Rod Laver com uma limpeza dos Slams de um ano inteiro, embora sem ser pela ordem do calendário, soa-me mais a prova de circo ou record do Guiness, imediamente a seguir ao da maior feijoada do mundo na Ponte Vasco da Gama.
A proeza em si mesmo de vencer em todas as superfícies é a vitória da polivalência, da capacidade de adaptação às circunstâncias adversas. É aprender a lidar com a superfície menos imediata. É reconhecer um adversário à altura e saber encontrar a resposta adequada. É vencer as dificuldades. E pelo caminho, destronar Sampras e tornar-se o melhor tenista de todos os tempos.
Nadal leva 59 jogos em terra batida sem perder. Nadal lidera no frente-a-frente, cinco vitórias e uma derrota. Embora nas últimas duas vezes que se defrontaram, o equilíbrio tenha sido a nota predominante. Aliás, no masters de Roma, o suíço chegou inclusivamente a ter matchpoint e não conseguiu fechar. Federer chegou sete vezes a uma final de Grand Slam e nunca perdeu nenhuma.
Poderá haver melhor envolvente para um jogo de ténis?
A imprensa e os críticos desportivos sempre atacaram e colocaram pressão sobre o Pistol Pete por este nunca ter levantado o troféu em Paris. Não foi por isso que deixaram de lhe chamar o melhor. E não um melhor qualquer. O de todos os tempos. Pudera. Quem se atreveria a mandar a primeira pedra ao maior coleccionador de taças de Grand Slam da história do desporto? Ele respondia apenas que não tinha nada a provar a ninguém.
Pessoalmente, acho que o Federer é ainda melhor que o americano de ascendência grega. Para além daquela capacidade inata de tirar o coelho da cartola quando é preciso, o suíço tem a técnica, a elegância, a souplesse que o tipo das sobrancelhas farfalhudas nunca teve. Talvez por isso, acho que ainda tem alguma coisa a provar.
Porque o resto, ele já o fez. Enfim, é certo que ainda “só” possui metade dos títulos do Sampras. Mas isso deve ser apenas uma questão de tempo, facilmente contornável para quem ainda vai a caminho do quarto de século. Para além de que isso é menos relevante, quem ganhou Wimbledon três vezes consecutivas não tem grande dificuldade em dizer que sabe jogar em relva.
E é aqui que entra a importância da final de hoje. Se Federer é de facto o jogador por excelência, terá que passar por cima do Nadal. Não tem outra hipótese. Se não o fizer, não será um Boris Becker que nunca ganhou nada em terra batida, é um facto. Mas arrisca-se seriamente a ser outro Sampras. Daqueles que, supostamente, não têm nada a provar.
O resto não interessa. Todos os outros records de que se fala são redundantes. Marcar presença na oitava meia-final de Slam consecutiva e chegar até ao Ivan Lendl, igualar Rod Laver com uma limpeza dos Slams de um ano inteiro, embora sem ser pela ordem do calendário, soa-me mais a prova de circo ou record do Guiness, imediamente a seguir ao da maior feijoada do mundo na Ponte Vasco da Gama.
A proeza em si mesmo de vencer em todas as superfícies é a vitória da polivalência, da capacidade de adaptação às circunstâncias adversas. É aprender a lidar com a superfície menos imediata. É reconhecer um adversário à altura e saber encontrar a resposta adequada. É vencer as dificuldades. E pelo caminho, destronar Sampras e tornar-se o melhor tenista de todos os tempos.
Nadal leva 59 jogos em terra batida sem perder. Nadal lidera no frente-a-frente, cinco vitórias e uma derrota. Embora nas últimas duas vezes que se defrontaram, o equilíbrio tenha sido a nota predominante. Aliás, no masters de Roma, o suíço chegou inclusivamente a ter matchpoint e não conseguiu fechar. Federer chegou sete vezes a uma final de Grand Slam e nunca perdeu nenhuma.
Poderá haver melhor envolvente para um jogo de ténis?
sábado, junho 10, 2006
Há um ano atrás, foi ver o sol a nascer por alturas de Vadajoz e fazer mais uns bons mil quilómetros para lá da fronteira. Depois, era ver-nos a subir e descer as ramvlas, Varceloneta para jantar, vocadillos para a esquerda e direita, o vairro gótico a casa Vatló e tanto mais. Até houve quem, de tão contente, tenha apanhado uma vuva.
Um dia, repito o convite para o regresso a Varcelona.
Um dia, repito o convite para o regresso a Varcelona.
sexta-feira, junho 09, 2006
quinta-feira, junho 08, 2006
Gosto de observar - quando estás distraído, absorto no teu universo paralelo. Quando os teus olhos pareciam vazios, longínquos, desfocados. Nesses momentos, há qualquer coisa de misterioso nesse teu rosto que o tempo se ocupou de lentamente endurecer, que os anos maltrataram.
Gostava de chegar até perto e interromper-te. Retirar-te desse torpor. Indagar, perceber o que poderá ser tão importante ao ponto de conseguir consumir toda a tua atenção. No entanto, nunca o farei. Porque ouvi uma vez que não se deve acordar um sonâmbulo.
Gostava de chegar até perto e interromper-te. Retirar-te desse torpor. Indagar, perceber o que poderá ser tão importante ao ponto de conseguir consumir toda a tua atenção. No entanto, nunca o farei. Porque ouvi uma vez que não se deve acordar um sonâmbulo.
terça-feira, junho 06, 2006
Às vezes pergunto-me – porque me deram uma vida. Sinto que me confiaram algo demasiado precioso para as minhas mãos, como um vaso que se está mesmo a ver a acabar no chão em cacos. Acuso a responsabilidade todos os dias de fazer dela o melhor possível.
segunda-feira, junho 05, 2006
Tudo começou - quando ainda era adolescente. As primeiras noitadas levaram aos primeiros copos, depois vieram as passas de tabaco, seguidas das brocas e do chamon. Quando deu por si, Zé Tolas estava a meter ácidos e ecstasy, passava as noites na disco de garrafa na mão a curtir trips. Daí até às drogas duras, a chutar na veia cavalo, foi um vê se te avias.
O vício não é barato, toda a gente sabe e, para quem não trabalhava, os problemas estavam à porta. Como arranjar carcanhol para a próxima dose. Quando a avozinha do Zé Tolas deu conta da ausência do cartão de crédito e reparou que as suas poupanças haviam sido delapidadas e, inclusivamente, as pratas, a baixela e o faqueiro tinham umas peças a menos, não foi de modos e fez um ultimato: ou vais para a clínica de desintoxicação ou vais para a rua.
Pouco interessado em meter metadona para o sistema em vez do pó branco, Zé Tolas não teve outro remédio senão fazer-se à vida. Começou a estacionar carros no centro da cidade. Primeiro escangalhou todos os parquímetros que encontrou e estabeleceu-se numa rua. Mal sabia ele que esta coisa dos carochos é negócio concorrido. Foi espancado por uns maganos que não toleraram a ingerência na zona deles e a fase de empreendedor rapidamente passou.
De maneira que não teve outro remédio senão enveredar pelo mundo obscuro do crime. Pequenos furtos aqui e ali, malas de senhoras de esticão, fananços dentro de lojas, aprendeu a nobre arte dos carteiristas e aplicou-a no metro da hora de ponta. Pensava ele que finalmente tinha um esquema bem montado e oleado quando foi apanhado em flagrante delito pela polícia.
O seu nome foi relacionado a uma série de outros crimes e o Zé Tolas foi dentro. Na cana, sofreu horrores. Nem sempre conseguia acesso ao pó miraculoso e o seu corpo torcia-se em convulsões com a síndrome de abstinência. Até que, um belo dia, achou que era demais, a sua vida tinha de mudar, tinha de tomar um novo rumo que, até hoje, nunca tivera.
Resolveu obter uma qualificação profissional, aprender um ofício que lhe permitisse ter uma actividade honesta e que lhe pusesse o pão na mesa assim que terminasse o seu tempo. Estava apostado em reintegrar-se na sociedade. Uns recomendavam-lhe a carpintaria, outros achavam que teria jeito para trabalhar com electricidade.
Disse que não a ambos. Após alguma introspecção, ocorreu-lhe uma actividade que lhe permitiria relembrar-se que a luta contra a droga é travada diariamente e que a recaída está sempre ao virar da esquina e, também, aproveitar todos os conhecimentos adquiridos ao longo de anos a chutar cavalo.
E foi assim que Zé Tolas abriu o seu consultório de acupunctura e outras medicinas alternativas, ao mesmo tempo que faz uns biscates numa loja de tatuagens.
O vício não é barato, toda a gente sabe e, para quem não trabalhava, os problemas estavam à porta. Como arranjar carcanhol para a próxima dose. Quando a avozinha do Zé Tolas deu conta da ausência do cartão de crédito e reparou que as suas poupanças haviam sido delapidadas e, inclusivamente, as pratas, a baixela e o faqueiro tinham umas peças a menos, não foi de modos e fez um ultimato: ou vais para a clínica de desintoxicação ou vais para a rua.
Pouco interessado em meter metadona para o sistema em vez do pó branco, Zé Tolas não teve outro remédio senão fazer-se à vida. Começou a estacionar carros no centro da cidade. Primeiro escangalhou todos os parquímetros que encontrou e estabeleceu-se numa rua. Mal sabia ele que esta coisa dos carochos é negócio concorrido. Foi espancado por uns maganos que não toleraram a ingerência na zona deles e a fase de empreendedor rapidamente passou.
De maneira que não teve outro remédio senão enveredar pelo mundo obscuro do crime. Pequenos furtos aqui e ali, malas de senhoras de esticão, fananços dentro de lojas, aprendeu a nobre arte dos carteiristas e aplicou-a no metro da hora de ponta. Pensava ele que finalmente tinha um esquema bem montado e oleado quando foi apanhado em flagrante delito pela polícia.
O seu nome foi relacionado a uma série de outros crimes e o Zé Tolas foi dentro. Na cana, sofreu horrores. Nem sempre conseguia acesso ao pó miraculoso e o seu corpo torcia-se em convulsões com a síndrome de abstinência. Até que, um belo dia, achou que era demais, a sua vida tinha de mudar, tinha de tomar um novo rumo que, até hoje, nunca tivera.
Resolveu obter uma qualificação profissional, aprender um ofício que lhe permitisse ter uma actividade honesta e que lhe pusesse o pão na mesa assim que terminasse o seu tempo. Estava apostado em reintegrar-se na sociedade. Uns recomendavam-lhe a carpintaria, outros achavam que teria jeito para trabalhar com electricidade.
Disse que não a ambos. Após alguma introspecção, ocorreu-lhe uma actividade que lhe permitiria relembrar-se que a luta contra a droga é travada diariamente e que a recaída está sempre ao virar da esquina e, também, aproveitar todos os conhecimentos adquiridos ao longo de anos a chutar cavalo.
E foi assim que Zé Tolas abriu o seu consultório de acupunctura e outras medicinas alternativas, ao mesmo tempo que faz uns biscates numa loja de tatuagens.
domingo, junho 04, 2006
Por causa - de coisas como esta, um gajo deixa de poder ir ao Guincho.
Embora o Nadal - tenha ainda alguns ossos duros de roer pela frente, como foi o Mathieu nesta ronda (e que jogo…) e como será o Hewitt já na próxima, por exemplo, estou a antever um dia desportivo muito importante de hoje a oito. Primeiro, durante a tarde, o Federer contra o espanhol na final de terra batida em Paris. E, depois, começa a quimera portuguesa, que se espera não terminar em triste fado, contra Angola, lá mais para a noite.
Slogans que marcaram uma geração
Há mar e mar, há ir e voltar
Se conduzir, não beba
A ponte é uma passagem para a outra margem
Há mar e mar, há ir e voltar
Se conduzir, não beba
A ponte é uma passagem para a outra margem
sábado, junho 03, 2006
Anunciou que se ia retirar. Havia sido um dos mais influentes tenistas no seu tempo, a curva decrescente já tinha começado a instalar-se progressivamente. Um dia, um jornalista perguntou-lhe por que quereria ser recordado no futuro. Vitórias, torneios, jogadas, estilo, técnica, tanto que um jogador com seis títulos de Grand Slam poderia dizer. Stefan Edberg respondeu seca e simplesmente:
Sportsmanship
Sportsmanship
sexta-feira, junho 02, 2006
Está a chegar mais uma apneia. Até há pouco tempo, 25 metros era uma distância impossível. Um dia deixou de ser. E percebi o truque. Respirar fundo, inspirar tudo o que for possível antes de dar o impulso na parede. Depois, esquecer que debaixo de água é um sítio péssimo para encher os pulmões. Procurar uma distracção. E progredir calmamente.
Metade do exercício é cabeça fria. A calma relaxa, faz o coração bater menos, o que por sua vez leva a um consumo de oxigénio menor. Quando dei por mim, já avistava o final do traço azul que guia os olhos submergidos, a parede lá ao fundo. Os últimos cinco metros doem. Mas tive a sensação que, à partida, estavam garantidos.
Metade do exercício é cabeça fria. A calma relaxa, faz o coração bater menos, o que por sua vez leva a um consumo de oxigénio menor. Quando dei por mim, já avistava o final do traço azul que guia os olhos submergidos, a parede lá ao fundo. Os últimos cinco metros doem. Mas tive a sensação que, à partida, estavam garantidos.
quinta-feira, junho 01, 2006
Tanta coisa da qual me poderia lembrar. Imensa. O teu olhar. O teu sorriso. Os dentes. O cabelo que escorria pelas costas expostas da roupa de verão. Os braços. As mãos, os dedos. O teu andar de mulher que só algumas mulheres têm.
Lembro-me de tocar a tua nuca, sentir o fio pelo teu pescoço, pelo peito abaixo, o espaço entre os teus seios. A base das costas. O umbigo. O ventre liso, de uma magreza exagerada, inconcebível.
Tanta coisa da qual me poderia lembrar. Passas-me a mão pela barba que não fiz, ajeitas-me a franja eternamente despenteada e ris-te. Encostas-me ao teu peito, os teus braços envolvem-me, as tuas pernas recebem-me, encurralam-me. Estou numa redoma, num casulo que me protege enquanto a tua pulsação me embala, o teu cheiro me inebria.
Tanta coisa da qual me poderia lembrar. Tanta coisa tua. No entanto, é só da tua voz que sinto a falta. Telefono-te. Ouço chamar do outro lado da linha, aquele som artificial e sinto-me crescentemente desconfortável há medida que a probabilidade de atenderes é maior. De repente, oiço-te.
Pouso o auscultador.
Lembro-me de tocar a tua nuca, sentir o fio pelo teu pescoço, pelo peito abaixo, o espaço entre os teus seios. A base das costas. O umbigo. O ventre liso, de uma magreza exagerada, inconcebível.
Tanta coisa da qual me poderia lembrar. Passas-me a mão pela barba que não fiz, ajeitas-me a franja eternamente despenteada e ris-te. Encostas-me ao teu peito, os teus braços envolvem-me, as tuas pernas recebem-me, encurralam-me. Estou numa redoma, num casulo que me protege enquanto a tua pulsação me embala, o teu cheiro me inebria.
Tanta coisa da qual me poderia lembrar. Tanta coisa tua. No entanto, é só da tua voz que sinto a falta. Telefono-te. Ouço chamar do outro lado da linha, aquele som artificial e sinto-me crescentemente desconfortável há medida que a probabilidade de atenderes é maior. De repente, oiço-te.
Pouso o auscultador.