terça-feira, fevereiro 28, 2006
Ricardo - olhou para o céu durante um longo período. Braços estendidos ao longo do corpo. Suspirou profundamente. E deu graças a Deus por existir o Baía.
segunda-feira, fevereiro 27, 2006
É a há muito prometida – mexida nos links. Não definitiva porque não estática. É uma luta dinâmica, feita por partes e “vaipes”.
O efeito - é completamente adulterado num avião comercial. Embora perfeitamente ciente da manobra, mesmo quem viaja à janela não tem nem pode ter a noção de tudo. Numa avioneta, tudo muda de perspectiva.
O dia era de Inverno, daqueles em que a cautela recomenda que se fique em terra. Chuva que se despenhava contra a estrutura metálica com um ruído ainda mais ensurdecedor que o do motor. Vento que abanava e impedia um voo suave.
Primeiro ao longe, as torres brancas. Amontoadas, como que dispostas por alguém que constrói degraus para atingir o azul muito escuro e vivo do céu revoltado. Voámos aos ziguezagues, contornámos, evitámos. Vislumbrámos e eu aproveitei para pôr o dedo no botão da máquina e ir disparando a eito.
Até que o nariz do aparelho começou lentamente a furar aquela cor esbranquiçada. O aspecto fibroso lembra algodão doce ou esponja de encher almofadas. De repente, qualquer que seja a janela, não vejo nada à minha volta senão àquela textura suave e inebriante.
Um nervoso miudinho instala-se, mais do que nas manobras mirabolantes. Embora saiba que atravesso condensação, a limitação do sentido da visão entra pela racionalidade adentro e leva-me a imaginar o pior dos cenários que é uma colisão.
À luz ao fundo do túnel. A nuvem acabou. Saímos. Inteiros, ilesos, sãos e salvos. Lá em baixo continua a lezíria, o rio corre com pouco caudal, os campos continuam verdes. A ponte é o meu marco. Ao lado está a pista onde, dentro de pouco, aterraremos.
O dia era de Inverno, daqueles em que a cautela recomenda que se fique em terra. Chuva que se despenhava contra a estrutura metálica com um ruído ainda mais ensurdecedor que o do motor. Vento que abanava e impedia um voo suave.
Primeiro ao longe, as torres brancas. Amontoadas, como que dispostas por alguém que constrói degraus para atingir o azul muito escuro e vivo do céu revoltado. Voámos aos ziguezagues, contornámos, evitámos. Vislumbrámos e eu aproveitei para pôr o dedo no botão da máquina e ir disparando a eito.
Até que o nariz do aparelho começou lentamente a furar aquela cor esbranquiçada. O aspecto fibroso lembra algodão doce ou esponja de encher almofadas. De repente, qualquer que seja a janela, não vejo nada à minha volta senão àquela textura suave e inebriante.
Um nervoso miudinho instala-se, mais do que nas manobras mirabolantes. Embora saiba que atravesso condensação, a limitação do sentido da visão entra pela racionalidade adentro e leva-me a imaginar o pior dos cenários que é uma colisão.
À luz ao fundo do túnel. A nuvem acabou. Saímos. Inteiros, ilesos, sãos e salvos. Lá em baixo continua a lezíria, o rio corre com pouco caudal, os campos continuam verdes. A ponte é o meu marco. Ao lado está a pista onde, dentro de pouco, aterraremos.
domingo, fevereiro 26, 2006
Carrocha. Dos antigos. Bem antigos. Mas impecavelmente limpo e arranjado. Cor: azul cueca. À frente, ele. Conduz com as duas mãos no volante. Usa óculos de armações grandes com muita massa. Olha fixamente a estrada, veste um pullover e traz a inconfundível boina enterrada na cabeça.
Atrás, ela. Do lado oposto, à direita. Olha pela pequena janela para a berma da estrada. Cabelo curto, lábios finos muito fechados, figura seráfica. Adivinho que leve as mãos dadas sobre o seu colo. Quarenta quilómetros horários, na melhor das hipóteses, num sítio onde facilmente se chega ao dobro dessa velocidade. É já bem grande a procissão que segue atrás deles.
Ó Portugal, nunca mudes, nunca desapareças.
Atrás, ela. Do lado oposto, à direita. Olha pela pequena janela para a berma da estrada. Cabelo curto, lábios finos muito fechados, figura seráfica. Adivinho que leve as mãos dadas sobre o seu colo. Quarenta quilómetros horários, na melhor das hipóteses, num sítio onde facilmente se chega ao dobro dessa velocidade. É já bem grande a procissão que segue atrás deles.
Ó Portugal, nunca mudes, nunca desapareças.
sexta-feira, fevereiro 24, 2006
Quando era miúdo ficava entusiasmado - porque todos os miúdos gostam de circo. Ou, pelo menos, assume-se que gostam. Pensando no assunto agora, acho que era mais a vontade de querer gostar do que, de facto, gostar. Ia assistir sobretudo a reboque da escola primária. Havia sempre uma altura do ano em que surgia um agrupamento ambulante e a tenda era colocada num terreno baldio perto do liceu de São João. Chen, Cardinali, não passava muito disso.
Eram o momento alto da noite, mas eu nem com essa idade conseguia achar graça aos palhaços. Gostava que alguém me explicasse que graça tem ver uns tipos com fardamentas coloridas e sapatos compridos a falar terrivelmente alto e de forma infantil, a estatelarem-se ao comprido na pista e a espetarem com bolos e tartes na fronha uns dos outros? Mesmo com dez anos.
Tornei-me ainda mais crítico. Detesto números com animais. Acho deprimente que se ponham os cãezinhos aos saltos por cima do lombo uns dos outros, chimpanzés a pedalar bicicletas, elefantes a evitar pisar os domadores, cavalos a correr às voltas, tigres a saltar por arcos em chamas. Deixem os animais em paz. Fico sentado a assistir a rezar para que o tigre morda o tipo do chicote, da mesma forma que torço sempre para que o touro enfie os cornos no toureiro.
Depois há os ilusionistas. O único problema que tenho com estes caramelos é o simples e singelo facto de que me irritam. Eu até acho que há uns que são óptimos artistas e fazem truques porreiros. Mas sinto-me sempre enganado. Tenho sempre a sensação de que estou a ser levado à certa. De que estou a levar um grande baile.
Hoje em dia, acho interessantes números de destreza física, salvam a honra do convento. Por isso, as correntes de circo asiáticas são os que mais me aprazem. Como os russos e os chineses, excelentes ginastas. Abro uma excepção neste tipo de performances às contorcionistas. Se aquelas tipas que se viram todas do avesso soubessem o mal que estão a fazer aos seus corpos e a maravilha que fazem aos bolsos dos seus futuros ortopedistas, pensariam duas vezes antes de coçar as orelhas com os calcanhares.
O maior espectáculo do mundo comigo não pega. O mundo de fantasia e diversão e riso e espanto e emoção não me diz praticamente nada.
Eram o momento alto da noite, mas eu nem com essa idade conseguia achar graça aos palhaços. Gostava que alguém me explicasse que graça tem ver uns tipos com fardamentas coloridas e sapatos compridos a falar terrivelmente alto e de forma infantil, a estatelarem-se ao comprido na pista e a espetarem com bolos e tartes na fronha uns dos outros? Mesmo com dez anos.
Tornei-me ainda mais crítico. Detesto números com animais. Acho deprimente que se ponham os cãezinhos aos saltos por cima do lombo uns dos outros, chimpanzés a pedalar bicicletas, elefantes a evitar pisar os domadores, cavalos a correr às voltas, tigres a saltar por arcos em chamas. Deixem os animais em paz. Fico sentado a assistir a rezar para que o tigre morda o tipo do chicote, da mesma forma que torço sempre para que o touro enfie os cornos no toureiro.
Depois há os ilusionistas. O único problema que tenho com estes caramelos é o simples e singelo facto de que me irritam. Eu até acho que há uns que são óptimos artistas e fazem truques porreiros. Mas sinto-me sempre enganado. Tenho sempre a sensação de que estou a ser levado à certa. De que estou a levar um grande baile.
Hoje em dia, acho interessantes números de destreza física, salvam a honra do convento. Por isso, as correntes de circo asiáticas são os que mais me aprazem. Como os russos e os chineses, excelentes ginastas. Abro uma excepção neste tipo de performances às contorcionistas. Se aquelas tipas que se viram todas do avesso soubessem o mal que estão a fazer aos seus corpos e a maravilha que fazem aos bolsos dos seus futuros ortopedistas, pensariam duas vezes antes de coçar as orelhas com os calcanhares.
O maior espectáculo do mundo comigo não pega. O mundo de fantasia e diversão e riso e espanto e emoção não me diz praticamente nada.
quinta-feira, fevereiro 23, 2006
E porque eu hoje - tirei o dia para falar de futebol, mais do mesmo. Não demora muito, não dói nada, é só uma promessa, enfim, mais um desafio público: se o Chelsea passar à fase seguinte a expensas do Barça, a islandesa salta do meu desktop e uma nova imagem, quiçá Stamford Bridge, quiçá a insígnia, quiçá um sobretudo valioso, tomará o seu lugar. É o máximo a que chega a minha idolatria. Não faço isto por muita gente.
E vocês são testemunhas.
E vocês são testemunhas.
Faltou deixar aqui - a homenagem ao Luisão. Enfim, se calhar mais à cabeça de extraterrestre do jogador do que propriamente ao próprio central. Mas isso é outra discussão.
quarta-feira, fevereiro 22, 2006
Quando me trocaram - o PC fiquei sobretudo contente porque o ruído que este emite é consideravelmente menos. É praticamente silencioso. Na altura, o facto de ser também mais moderno e mais rápido não me fez saltar de alegria. Se bem que me ocorreu que a cor preta da caixa e o prateado da zona frontal sempre são mais fashion e jogam bem com o resto da decoração.
Entretanto, a vida evolui. As milhentas tabelas com milhentos registos, os programas a correr, as toneladas de ficheiros abertos, tudo a funcionar em simultâneo, fizeram-me despertar do meu estado cataléptico. Agora, tenho alturas em que desespero. Em que me apetece arrancar os cabelos um a um enquanto vejo aquela ampulheta irritante a gritar-me que tenho que esperar enquanto os códigos de programação vão correndo pela janela que indica a evolução do processo. Devagar. Sempre devagar.
Foi num destes dias que me lembrei que podia haver um tuning para computadores. Eu faço do meu cobaia, se isso contribuir para o desenvolvimento da ciência. Mandava “quitar” o motor, instalar uns escapes de rendimento, uns “élerôns”, umas entradas de ar na parte da frente, umas jantes XPTO, tudo em prol de uns cavalos extra. Se for preciso, até ponho autocolantes a dizer “modhificomputador” ou “alpine”, não me importo, sobrevivo.
Mas por favor, ponham-me aquilo a andar mais depressa.
Entretanto, a vida evolui. As milhentas tabelas com milhentos registos, os programas a correr, as toneladas de ficheiros abertos, tudo a funcionar em simultâneo, fizeram-me despertar do meu estado cataléptico. Agora, tenho alturas em que desespero. Em que me apetece arrancar os cabelos um a um enquanto vejo aquela ampulheta irritante a gritar-me que tenho que esperar enquanto os códigos de programação vão correndo pela janela que indica a evolução do processo. Devagar. Sempre devagar.
Foi num destes dias que me lembrei que podia haver um tuning para computadores. Eu faço do meu cobaia, se isso contribuir para o desenvolvimento da ciência. Mandava “quitar” o motor, instalar uns escapes de rendimento, uns “élerôns”, umas entradas de ar na parte da frente, umas jantes XPTO, tudo em prol de uns cavalos extra. Se for preciso, até ponho autocolantes a dizer “modhificomputador” ou “alpine”, não me importo, sobrevivo.
Mas por favor, ponham-me aquilo a andar mais depressa.
terça-feira, fevereiro 21, 2006
segunda-feira, fevereiro 20, 2006
A Hipotenusa - resolveu assumir o triângulo rectângulo amoroso em que vivia. Divorciou-se do Teorema e casou-se em segundas núpcias com o Ângulo Recto. Após largos meses de tentativas infrutíferas e inúmeras consultas de fertilidade, decidiram-se por adoptar um Pitágoras.
Ironia do destino, pouco tempo depois estava grávida de dois lindos catetos.
Ironia do destino, pouco tempo depois estava grávida de dois lindos catetos.
domingo, fevereiro 19, 2006
Algum mérito - é preciso dar ao Big Brother e aos demais reality shows. Estão todos concentrados na TVI. É uma espécie de ghetto televisivo. É discriminação e pode não soar bem por causa disso mas, convenhamos, que é muito bom saber que, se um tipo não está de todo interessado, pode sempre mudar de canal. Pode não apanhar nada de jeito à mesma nos outros, isso é outra questão. Mas pode mudar.
Agora ter todos os canais a passar a mesma trasladação de um corpo, sem qualquer hipótese de desviar do perigo, sem escolha alternativa possível, é que não se faz a ninguém. Parece aquele serviço da SportTv que permite ver o mesmo golo de 127 ângulos diferentes: RTP, caixão visto pela esquerda; SIC, grande panorama sobre a multidão; TVI, outra porcaria qualquer.
Digam o que disserem, isto é puro terrorismo audiovisual.
Agora ter todos os canais a passar a mesma trasladação de um corpo, sem qualquer hipótese de desviar do perigo, sem escolha alternativa possível, é que não se faz a ninguém. Parece aquele serviço da SportTv que permite ver o mesmo golo de 127 ângulos diferentes: RTP, caixão visto pela esquerda; SIC, grande panorama sobre a multidão; TVI, outra porcaria qualquer.
Digam o que disserem, isto é puro terrorismo audiovisual.
A condição sine qua non - para pertencer e ser bem aceite na terceira idade é, sem margem para dúvidas, cheirar a naftalina (não confundir com aqueloutra do Jardel). São raros os reformados que não se façam acompanhar para todo o lado desse odor. Aliás, quer-me parecer que os que não o fazem são discriminados pela sociedade em que vivemos.
Tentei perceber as causas deste fenómeno. Será que as traças fazem uma distinção das idades e gostam mais da roupa dos velhos do que dos novos? E é em resposta a esta estrutura de preferências das traças que os velhotes enchem os armários de bolas ou outros apetrechos que fedem? E que os põem, eles próprios, a feder.
A F. tem uma teoria. Porque a F. já pensou nisto muito a sério. E partilhou-a comigo ontem. As traças não gostam mais da roupa das pessoas com mais idade. As pessoas com mais idade não precisam, portanto, de encher até acima o armário com naftalina.
Trata-se de um problema orgânico e endógeno. É uma questão endócrina. A partir de certa idade, as glândulas humanas alteram-se. De tal forma que os velhotes passam a exalar um cheiro muito semelhante ao da naftalina. Em vez de suor, como a malta jovem.
A indústria dos cosméticos está uns quantos passos atrás. Senão existiria uma linha de desodorizantes para a terceira idade.
Tentei perceber as causas deste fenómeno. Será que as traças fazem uma distinção das idades e gostam mais da roupa dos velhos do que dos novos? E é em resposta a esta estrutura de preferências das traças que os velhotes enchem os armários de bolas ou outros apetrechos que fedem? E que os põem, eles próprios, a feder.
A F. tem uma teoria. Porque a F. já pensou nisto muito a sério. E partilhou-a comigo ontem. As traças não gostam mais da roupa das pessoas com mais idade. As pessoas com mais idade não precisam, portanto, de encher até acima o armário com naftalina.
Trata-se de um problema orgânico e endógeno. É uma questão endócrina. A partir de certa idade, as glândulas humanas alteram-se. De tal forma que os velhotes passam a exalar um cheiro muito semelhante ao da naftalina. Em vez de suor, como a malta jovem.
A indústria dos cosméticos está uns quantos passos atrás. Senão existiria uma linha de desodorizantes para a terceira idade.
sábado, fevereiro 18, 2006
Eu percebo - que quando uma banana não está madura tem, de facto, uma coloração esverdeada. O mesmo se passa com outros frutos como as peras, por exemplo. Ou seja, nesses casos específicos em que, de facto, existe uma alteração cromática no estado de maturação de fruta de verde, e aqui refiro-me tanto à cor como ao facto de não estar madura, para madura.
Mas isto levanta uma grave questão. Se a fase do processo de maturação em que a fruta ainda não está madura se chama “verde”, porque raio é que a fase de madura não há de ter sido baptizada com nenhum nome de cor? Porque carga de água é que não se diz, por exemplo, tal fruta está mesmo boa de comer porque está mesmo amarelinha? Ou vermelhinha? Ou cor-de-rosinha?
E retorquem vocês que são pessoas atentas e sempre de resposta na ponta da língua: porque a fruta madura não é amarelinha! Nem vermelhinha. Nem cor-de-rosinha. Ai não? Então e a banana que referi há pouco? Então e as mangas de rabinho avermelhado? Então e as melancias? Enfim, para cor-de-rosinha é que não se me ocorre grande coisa senão lichias.
E agora ataco eu a designação “verde”. Então será que isso quer dizer que as maçãs verdes nunca ficam maduras? Ou será que é a cor interior do fruto que dita o estado de maturação? Sendo assim os kiwis são intragáveis em qualquer fase da respectiva vida. Já para não dizer que são castanhos por fora. E têm uma má relação com a depilação.
Mas isto levanta uma grave questão. Se a fase do processo de maturação em que a fruta ainda não está madura se chama “verde”, porque raio é que a fase de madura não há de ter sido baptizada com nenhum nome de cor? Porque carga de água é que não se diz, por exemplo, tal fruta está mesmo boa de comer porque está mesmo amarelinha? Ou vermelhinha? Ou cor-de-rosinha?
E retorquem vocês que são pessoas atentas e sempre de resposta na ponta da língua: porque a fruta madura não é amarelinha! Nem vermelhinha. Nem cor-de-rosinha. Ai não? Então e a banana que referi há pouco? Então e as mangas de rabinho avermelhado? Então e as melancias? Enfim, para cor-de-rosinha é que não se me ocorre grande coisa senão lichias.
E agora ataco eu a designação “verde”. Então será que isso quer dizer que as maçãs verdes nunca ficam maduras? Ou será que é a cor interior do fruto que dita o estado de maturação? Sendo assim os kiwis são intragáveis em qualquer fase da respectiva vida. Já para não dizer que são castanhos por fora. E têm uma má relação com a depilação.
sexta-feira, fevereiro 17, 2006
Mais algumas horitas – e lá vou eu percorrer a pé os metros do Green Mile outra vez. Felizmente não vou sozinho.
quinta-feira, fevereiro 16, 2006
O meu olhar - foge, divaga, deambula para lá dos dois metros que me separam da parede. Olho mas não vejo porque não há limite e aquela barreira opaca branca, de tijolo, tinta e estuque não é suficiente para me conter. Não sou eu que mando, perdi o controle sobre aquilo que faço. Sou como o comandante de um navio amotinado, a ferros no porão.
Uma parte roga, implora de joelhos no chão, por regressar à secretária, à parede que está dois metros à minha frente, ao branco da tinta e do estuque sobre o tijolo que está escondido. Como um crente num local de culto que junta toda a sua força numa única vontade e espera que essa ânsia lhe seja proveitosa.
Às vezes resulta. E, como que aspergido por inspiração divina, reparo sobressaltado que há uma parede a dois metros de mim, branca do estuque que cobre os tijolos que não vejo. Afinal, esteve ali o tempo todo. Assim como uma secretária e todo o tipo de coisas que costumam estar em cima das secretárias.
Mexo um pouco a cabeça. Desnorteado. Tenho que franzir a testa, aguçar o olhar para voltar a ver. Observar. Perceber. Levanto-me, dou algumas voltas, por vezes andar ajuda-me a pensar. Puxo pela memória, avivo-a. Para voltar a saber onde ia, retomar o fio à meada.
Outras vezes não resulta. Como se me tivessem atingido com curare, o corpo não obedece. A mente não obedece. Nada obedece. Mãos braços pés pernas. O coração teima em bater, os pulmões enchem-se e esvaziam-se, a boca talvez se mexa, os olhos fecham e abrem a espaços. Mas apenas porque preciso que o façam.
Nada obedece. Senão a minha vontade. Aquela que não vê paredes. A dois metros de mim.
Uma parte roga, implora de joelhos no chão, por regressar à secretária, à parede que está dois metros à minha frente, ao branco da tinta e do estuque sobre o tijolo que está escondido. Como um crente num local de culto que junta toda a sua força numa única vontade e espera que essa ânsia lhe seja proveitosa.
Às vezes resulta. E, como que aspergido por inspiração divina, reparo sobressaltado que há uma parede a dois metros de mim, branca do estuque que cobre os tijolos que não vejo. Afinal, esteve ali o tempo todo. Assim como uma secretária e todo o tipo de coisas que costumam estar em cima das secretárias.
Mexo um pouco a cabeça. Desnorteado. Tenho que franzir a testa, aguçar o olhar para voltar a ver. Observar. Perceber. Levanto-me, dou algumas voltas, por vezes andar ajuda-me a pensar. Puxo pela memória, avivo-a. Para voltar a saber onde ia, retomar o fio à meada.
Outras vezes não resulta. Como se me tivessem atingido com curare, o corpo não obedece. A mente não obedece. Nada obedece. Mãos braços pés pernas. O coração teima em bater, os pulmões enchem-se e esvaziam-se, a boca talvez se mexa, os olhos fecham e abrem a espaços. Mas apenas porque preciso que o façam.
Nada obedece. Senão a minha vontade. Aquela que não vê paredes. A dois metros de mim.
quarta-feira, fevereiro 15, 2006
Vou fazer um auto-plágio. Contexto: troca de mails acerca do concerto do Mehldau de sexta-feira no CCB. Fui interrogado com algum tacto, pés de lã de quem faz uma pergunta retórica estilo não gostaste muito, pois não? A inspiração tem destas coisas, nem sempre surge. Eu, que ainda não tinha tido o tempo mental para escrever sobre o que ouvi e vi, escrevi. Com pouco tempo físico, mas escrevi.
Vou-me abster de fazer correcções ao texto, vai cru como os mails devem ser. Ipsis verbis. Apenas corrigi uma palavra que reparei que estava mal escrita. Para além disso, vou pôr aspas a mim próprio, fica bonito.
«[A propósito do terceiro encore da noite, o Tune Up, do qual demorei imenso tempo a lembrar] Saí de lá com aquilo na cabeça sem conseguir chegar ao nome do raio do tema. Enfim, lembrei-me com alguma (muita) ajuda do Público. E ainda tocou um blues qualquer que é suposto eu conhecer.
[Dirigindo-me à pergunta] Não... Confesso. Primeiro que tudo, um problema de expectativas. Eu fui para lá com a perspectiva de levar uma valente sova, na onda do Art of the Trio, de música frenética, dura de ouvir, cansativa, muito tensa, rija. Queria ouvir standards transfigurados, tocados em compassos alterados, levados ao extremo. E originais, para o mesmo efeito tanto dá, standards é mais giro porque apercebes-te da reviravolta que levaram. Isto porque quando eu penso no Mehldau isso é a primeira coisa que me vem à cabeça.
É perfeitamente lícito que ele se vire para versões, covers, pop. Tudo bem, não me escandaliza minimamente. Agora, independentemente do meu desajuste de expectativas, o que não é nada lícito é que o tipo se torne sensaborão, chato, monótono. Juro-te que pensei que era eu que estava armado em parvo quando vejo toda a gente a ir ao rubro e eu não estava a achar nada de especial. Pensei: estás cansado, estás com fome, não são as condições ideais para ver isto. Eh pá, mas com a secção rítmica a tocar a um tempo rapidíssimo, mesmo a pedir para partir aquilo tudo, e ao mesmo tempo ver o caramelo a dar meia dúzia de notas dissonantes sem graça nenhuma, sem discurso, sem lógica... Só resultou nas baladas e na intro.
Doeu-me. Confesso. Ia ver outra vez, mesmo tocando mal continua a ser um grande espectáculo. Tecnicamente, sobretudo. É mais ou menos como o Federer, jogando abaixo daquilo que é capaz continua a ganhar Slams. Mas não invalida que me fique a saber a muito pouco. E acho que é essa coisa da inspiração é um bode expiatório com costas muito largas. Um músico a sério não pode contar com a inspiração para salvar a honra do convento; isso é para nabos como eu. Tem que tocar bem, ponto final. Pode ter um dia em que está mais onfire. Mas o que eu vi na 6a não é "atribuível" a uma inspiração nas ruas da amargura. Eu acho que é falta de preparação. Que é como quem diz, profissionalismo. Por muito pouco prosaico e simpático que isto possa ser, a dita inspiração trabalha-se.
[em resposta à quase-pergunta em relação ao Grenadier] (Eu gostei mais do Ballard, acho que foi o único que puxou aquilo verdadeiramente para a frente. Mas isto também sou eu que tenho alguma dificuldade com os baixistas modernos)
E pronto, escrevi um mail gigantesco que vai fazer as vezes do post que queria pôr online e ainda não tinha saído.»
Vou-me abster de fazer correcções ao texto, vai cru como os mails devem ser. Ipsis verbis. Apenas corrigi uma palavra que reparei que estava mal escrita. Para além disso, vou pôr aspas a mim próprio, fica bonito.
«[A propósito do terceiro encore da noite, o Tune Up, do qual demorei imenso tempo a lembrar] Saí de lá com aquilo na cabeça sem conseguir chegar ao nome do raio do tema. Enfim, lembrei-me com alguma (muita) ajuda do Público. E ainda tocou um blues qualquer que é suposto eu conhecer.
[Dirigindo-me à pergunta] Não... Confesso. Primeiro que tudo, um problema de expectativas. Eu fui para lá com a perspectiva de levar uma valente sova, na onda do Art of the Trio, de música frenética, dura de ouvir, cansativa, muito tensa, rija. Queria ouvir standards transfigurados, tocados em compassos alterados, levados ao extremo. E originais, para o mesmo efeito tanto dá, standards é mais giro porque apercebes-te da reviravolta que levaram. Isto porque quando eu penso no Mehldau isso é a primeira coisa que me vem à cabeça.
É perfeitamente lícito que ele se vire para versões, covers, pop. Tudo bem, não me escandaliza minimamente. Agora, independentemente do meu desajuste de expectativas, o que não é nada lícito é que o tipo se torne sensaborão, chato, monótono. Juro-te que pensei que era eu que estava armado em parvo quando vejo toda a gente a ir ao rubro e eu não estava a achar nada de especial. Pensei: estás cansado, estás com fome, não são as condições ideais para ver isto. Eh pá, mas com a secção rítmica a tocar a um tempo rapidíssimo, mesmo a pedir para partir aquilo tudo, e ao mesmo tempo ver o caramelo a dar meia dúzia de notas dissonantes sem graça nenhuma, sem discurso, sem lógica... Só resultou nas baladas e na intro.
Doeu-me. Confesso. Ia ver outra vez, mesmo tocando mal continua a ser um grande espectáculo. Tecnicamente, sobretudo. É mais ou menos como o Federer, jogando abaixo daquilo que é capaz continua a ganhar Slams. Mas não invalida que me fique a saber a muito pouco. E acho que é essa coisa da inspiração é um bode expiatório com costas muito largas. Um músico a sério não pode contar com a inspiração para salvar a honra do convento; isso é para nabos como eu. Tem que tocar bem, ponto final. Pode ter um dia em que está mais onfire. Mas o que eu vi na 6a não é "atribuível" a uma inspiração nas ruas da amargura. Eu acho que é falta de preparação. Que é como quem diz, profissionalismo. Por muito pouco prosaico e simpático que isto possa ser, a dita inspiração trabalha-se.
[em resposta à quase-pergunta em relação ao Grenadier] (Eu gostei mais do Ballard, acho que foi o único que puxou aquilo verdadeiramente para a frente. Mas isto também sou eu que tenho alguma dificuldade com os baixistas modernos)
E pronto, escrevi um mail gigantesco que vai fazer as vezes do post que queria pôr online e ainda não tinha saído.»
A minha singela homenagem – ao dia que passou ontem. Um pouco atrasada, antes tarde que nunca. Minha divertida Valentina, em português, ou aquilo que Armando Gama terá alegadamente dito quando conheceu a sua mais-que-tudo.
Sugestões de confecção: na versão a solo do Chet Baker ou instrumental do Jim Hall com o Bill Evans, álbum Undercurrent. Se eu já tivesse percebido como se põem músicas online com aquelas barrinhas trendy do Media Player, até punha agora. Mas não sei. Fica para um dia. Para já, vou ali seguir o meu próprio conselho e já volto.
My funny valentine
Sweet comic valentine
You make me smile with my heart
Your looks are laughable, unphotographable
Yet you're my favorite work of art
Is your figure less than Greek?
Is your mouth a little bit weak?
When you open it to speak, are you smart?
Don't change you hair for me
Not if you care for me
Stay little valentine, stay
Each day is Valentine's day
Richard Rodgers and Lorenz Hart
Sugestões de confecção: na versão a solo do Chet Baker ou instrumental do Jim Hall com o Bill Evans, álbum Undercurrent. Se eu já tivesse percebido como se põem músicas online com aquelas barrinhas trendy do Media Player, até punha agora. Mas não sei. Fica para um dia. Para já, vou ali seguir o meu próprio conselho e já volto.
My funny valentine
Sweet comic valentine
You make me smile with my heart
Your looks are laughable, unphotographable
Yet you're my favorite work of art
Is your figure less than Greek?
Is your mouth a little bit weak?
When you open it to speak, are you smart?
Don't change you hair for me
Not if you care for me
Stay little valentine, stay
Each day is Valentine's day
Richard Rodgers and Lorenz Hart
domingo, fevereiro 12, 2006
Por motivos - de ordem técnica, nomeadamente e a saber, colapso cerebral após tarde de difícil, diria mesmo complicado, acérrimo e árduo estudo, o bloguista de serviço encontra-se momentaneamente encerrado para obras. Retomaremos a emissão assim que possível. Prometemos ser breves.
Obrigado pela vossa compreensão.
Obrigado pela vossa compreensão.
sábado, fevereiro 11, 2006
Em como o dinheiro – foi inventado para curar mini-depressões através da possibilidade de fúrias temporárias ultra-consumistas. Os alvos preferidos são, obviamente, CD’s, livros e roupa. A ordem da listagem não pretende estabelecer nenhuma relação de preferência.
quinta-feira, fevereiro 09, 2006
Há um grave problema - com trocos que possuo num dado momento de tempo.. Nunca são na quantidade certa. Ou tenho imenso cascalho de tal forma que a minha carteira está pesadíssima e anafada como uma piton depois de ter comido um boi. Ou falta-me uma moeda de cinco cêntimos para a máquina da sandocha. Que nunca aceita as porcarias inúteis de um e dois cêntimos. Das quais nunca me consigo livrar.
É por isso que abomino moedas.
É por isso que abomino moedas.
quarta-feira, fevereiro 08, 2006
O que mais me custa - numa aula de natação são os exercícios só de braços. Não porque me cansem mais ou os sinta particularmente exigentes. Mas porque é preciso usar uma pool buoy. De cada vez que pego numa daquelas coisas e a prenso como manda a lei, tenho calafrios.
Olho em redor. Na minha pista e nas adjacentes, adolescentes e malta na casa dos vinte. Na outra ponta, miúdos a aprender a nadar. Lá perto, pessoas que praticam natação livre. Do lado oposto, idades mais avançadas. Quarentas, cinquentas até sessentas. Já cheguei a ver, inclusive, velhotas de toca transparente de chuveiro de hotel. E depois penso que aquela mesma prancha que vou usar já deve ter estado, em algum momento, no meio de todos pares de pernas diferentes que vislumbro.
E então dá-me uma vontade doida de regressar ao balneário.
Olho em redor. Na minha pista e nas adjacentes, adolescentes e malta na casa dos vinte. Na outra ponta, miúdos a aprender a nadar. Lá perto, pessoas que praticam natação livre. Do lado oposto, idades mais avançadas. Quarentas, cinquentas até sessentas. Já cheguei a ver, inclusive, velhotas de toca transparente de chuveiro de hotel. E depois penso que aquela mesma prancha que vou usar já deve ter estado, em algum momento, no meio de todos pares de pernas diferentes que vislumbro.
E então dá-me uma vontade doida de regressar ao balneário.
Regra de três simples - Ao Belmiro deu-lhe para estar para a PT como o Marocas para o Palácio de Belém.
terça-feira, fevereiro 07, 2006
De cada vez – que vejo o Marcelo na TV, fico crescentemente preocupado. O homem está com um catarro, alto lá com o serviço. Para um tipo que passa a vida a fazer a apologia da sua própria saúde e condição física, aquela tosse e aquela necessidade de aclarar a garganta ficam muito mal.
segunda-feira, fevereiro 06, 2006
Olhou-o do alto daquela torre de marfim que é a convicção e disse-lhe. Indignada e ríspida. Tu não existes. Não passas de uma ficção. És como uma personagem de um filme. És um desenho animado. Aliás, qualquer semelhança entre ti e a realidade é pura coincidência.
Desde então, não há um único dia que passe sem que a primeira coisa que ele faz de manhã assim que se levanta, seja olhar-se ao espelho. Não é que ele não tenha consciência que ela está errada, que cometeu um abuso de linguagem para vincar um ponto, uma imagem quase literária. Sabe-o e acredita-o em todas as células do seu corpo.
Mas só para ter certeza.
Desde então, não há um único dia que passe sem que a primeira coisa que ele faz de manhã assim que se levanta, seja olhar-se ao espelho. Não é que ele não tenha consciência que ela está errada, que cometeu um abuso de linguagem para vincar um ponto, uma imagem quase literária. Sabe-o e acredita-o em todas as células do seu corpo.
Mas só para ter certeza.
sábado, fevereiro 04, 2006
O mais certo - era eu já estar ciente disso há muito tempo. Mas ainda não ter tido a capacidade de o admitir ou reconhecer conscientemente. Dormi agitado, acordei estremunhado, passei a manhã tenso. Entretanto fui à prateleira de cima, a última onde consigo chegar sem precisar de esticar mesmo até às pontinhas dos pés. E tirei um conjunto de CDs brancos, Deutsche Grammophon, Karajan.
Uma hora depois estava calmo e concentrado. Uma tarde depois e o estudo rendeu. A receita? Sinfonias do Beethoven. Todas. Não sei que raio aquela música tem, mas comigo funciona como um autêntico “moral boost”. É quase como se o som nem sequer estivesse lá. Não sei explicar.
Agora, jantar do Nunão para espairecer.
Uma hora depois estava calmo e concentrado. Uma tarde depois e o estudo rendeu. A receita? Sinfonias do Beethoven. Todas. Não sei que raio aquela música tem, mas comigo funciona como um autêntico “moral boost”. É quase como se o som nem sequer estivesse lá. Não sei explicar.
Agora, jantar do Nunão para espairecer.
sexta-feira, fevereiro 03, 2006
“Mas eu era mesmo para te ligar. O problema foi que quando guardei a folha, lembras-te da folha onde me escreveste o teu número?, furei para pôr no dossier e só depois é que reparei que tinha feito a bolinha mesmo por cima do número! E, ainda por cima, aquilo comeu logo dois algarismos. É que se fosse só um, só teria no máximo que tentar dez possibilidades até descobrir qual era mesmo o teu. Mas com dois algarismos, poderia ter que experimentar cem até acertar! Pronto, cem não, noventa e nove…”.
Acerca da bela arte da desculpa esfarrapadíssima.
Acerca da bela arte da desculpa esfarrapadíssima.
quinta-feira, fevereiro 02, 2006
O que é que é – essa coisa dos prazos de validade? Supondo que eu tinha um iogurte tranquilamente arrumado no meu frigorífico, sossegado da vida, desde a semana passada. Supondo também, para continuar o suponhamos, que na tampa do iogurte está escrita a data de validade “31/01/06”. O que é que isto quer dizer?
Será que é no início do dia 31 que o iogurte vira azedo? Será que dia 31 é o último dia possível para o comer e que só à meia-noite é que fica estragado? Será que há uma colónia de microorganismo ávidos que esperam pacientemente dentro do frigorífico, ao frio, sempre a olhar para o relógio, pelas 0h00 do dia em questão para atacarem a embalagem e para sempre desgraçarem o seu conteúdo?
E como é que eu sei que os microorganismos vão manter a promessa de só atacar naquele momento? Como é que eu sei que eles não têm o relógio adiantado? Pior: mas porque carga de água é que eles hão-de ser honestos? Por que é que eu hei de acreditar naquilo que um microorganismo diz? Como é que eu sei que não furam o acordo e passam à prática antes da hora prevista? Como é que eu sei que não vou apanhar uma valente indisposição?
Sejamos realistas. A maioria dos iogurtes de hoje em dia tem uma tal bateria de bichinhos e coisas saborosas e saudáveis lá dentro, como os bifidus activos e demais companhia, que, confesso, custa-me a acreditar que uns tipos enregelados dentro de um frigorífico consigam resistir uma semana ou mais até comerem aquilo tudo. Basta ver que eu próprio não consigo resistir e estou à temperatura ambiente.
Vou correndo o risco. Mais do que cálcio ou vitaminas, os iogurtes são uma fonte de adrenalina.
Será que é no início do dia 31 que o iogurte vira azedo? Será que dia 31 é o último dia possível para o comer e que só à meia-noite é que fica estragado? Será que há uma colónia de microorganismo ávidos que esperam pacientemente dentro do frigorífico, ao frio, sempre a olhar para o relógio, pelas 0h00 do dia em questão para atacarem a embalagem e para sempre desgraçarem o seu conteúdo?
E como é que eu sei que os microorganismos vão manter a promessa de só atacar naquele momento? Como é que eu sei que eles não têm o relógio adiantado? Pior: mas porque carga de água é que eles hão-de ser honestos? Por que é que eu hei de acreditar naquilo que um microorganismo diz? Como é que eu sei que não furam o acordo e passam à prática antes da hora prevista? Como é que eu sei que não vou apanhar uma valente indisposição?
Sejamos realistas. A maioria dos iogurtes de hoje em dia tem uma tal bateria de bichinhos e coisas saborosas e saudáveis lá dentro, como os bifidus activos e demais companhia, que, confesso, custa-me a acreditar que uns tipos enregelados dentro de um frigorífico consigam resistir uma semana ou mais até comerem aquilo tudo. Basta ver que eu próprio não consigo resistir e estou à temperatura ambiente.
Vou correndo o risco. Mais do que cálcio ou vitaminas, os iogurtes são uma fonte de adrenalina.